Editorial: a legalização da picaretagem eleitoral no País

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O editoral “A legalização da picaretagem eleitoral do país” foi publicado hoje (27) no jornal Diário dos Campos, de Ponta Grossa, no Paraná: “A derrubada da verticalização (regra que obriga alianças nacionais a serem respeitadas nos Estados) legaliza a picaretagem eleitoral no Brasil. Não bastassem as denúncias de caixa dois e a infinidade de legendas partidárias existentes no País – criadas a rodo, sem qualquer fundo ideológico –, entre tantos outros problemas que emporcalham o sistema político brasileiro, agora nossos parlamentares querem voltar a ter “liberdade”. Mas não é uma liberdade política, para exercer a democracia mais plenamente na definição das alianças entre os partidos nas disputas eleitorais. Trata-se de uma liberalização para a prática de negociatas. As legendas que defendem o fim da verticalização estão preocupadas, na verdade, em traficar a influência que elas têm pelo Brasil afora com o tempo de rádio e televisão. Os partidos que não têm nomes fortes para candidatos nas eleições presidenciais deste ano seriam os mais beneficiados. Como bem observou ontem o jornalista Fernando Rodrigues, que acompanha os bastidores da política em Brasília, sem a verticalização um partido de médio porte ou mesmo um grande que não tenha candidato negocia 27 vezes o tempo de TV, uma vez em cada unidade da federação. Ou seja, a mudança na regra nada tem a ver, de fato, com diferenças regionais. O interesse dos que golpeiam a verticalização é um só: negociar o tempo de rádio e TV. Paralelo a esse pano de fundo da discussão acerca da verticalização, outro aspecto precisa ser evocado: o da ética e da moral na política. Infelizmente, foi-se o tempo em que os eleitores conseguiam identificar nos partidos uma linha ou doutrina ideológica. Hoje não existe mais partido de esquerda, de direita ou de centro. Existem os que estão no poder e os da oposição. Com isso, o fim da verticalização surge para atender a uma demanda dos partidos, que poderão, em cada unidade da federação, apresentar uma postura diferente, se aliando a qualquer legenda, independentemente das alianças feitas nos outros estados. As legendas poderão agir como verdadeiros camaleões, camuflando-se de acordo com as conveniências. É como se a palavra “coerência” fosse banida de vez do vocabulário dos partidos políticos. Mais um aspecto ainda intriga na aprovação, pela Câmara Federal, na última quarta-feira, do projeto que derruba a verticalização. A mudança é flagrantemente inconstitucional. O artigo 16 da Constituição é claro ao dizer que as regras do jogo não podem ser mudadas em ano eleitoral. Mas talvez aí, neste atropelo à legislação, resida a esperança de que a tentativa de alguns políticos de acabar com a verticalização, seja infrutífera. Caso seja aprovada em segunda votação pela Câmara e logo em seguida promulgada, dificilmente a mudança entrará em vigor. As chances de ela ser barrada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) são enormes. Vários parlamentares já manifestaram a intenção de entrar com uma Adin (Ação Direta de Inconstitucionalidade) para anular o efeito de emenda constitucional. E a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) engrossa o coro daqueles que não admitem a legalização da picaretagem eleitoral no País. Resta esperar que o bom senso da Justiça prevaleça, e o surto de insanidade daqueles que querem o fim da verticalização não implique em prejuízos maiores para o País”.