O ADICIONAL POR TEMPO DE SERVIÇO DOS SERVIDORES PÚBLICOS

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André L. Borges Netto Advogado constitucionalista em Campo Grande-MS [email protected] Tema que tem dado margem a discussão judicial diz respeito à ausência de cálculo correto, por parte do Poder Público, do valor do adicional por tempo de serviço dos servidores públicos. Vamos à análise do tema, sendo que reconhecemos que nossa opinião representa apenas um dos posicionamentos possíveis sobre a matéria. Antes da recente Reforma Administrativa procedida pelo Governo Estadual, previa o “caput” do art. 111 da Lei Estadual nº 1.102/90 (Estatuto dos Funcionários Públicos Estaduais) que “o adicional por tempo de serviço é devido por qüinqüênio de efetivo exercício prestado ao Estado, incidente sobre a remuneração de que trata o art. 73, § 3º, desta Lei”. Por sua vez, a regra do art. 73, § 3º, da mesma Lei Estadual, previa que: “Art. 73 – Remuneração é o vencimento do cargo efetivo, acrescido das vantagens permanentes e temporárias, estabelecidas em lei. (…) § 3º – O vencimento do cargo efetivo, acrescido das vantagens de caráter permanente, é irredutível e observará o princípio da isonomia, quando couber”. Da leitura conjunta dos arts. 111 e 73, § 3º, da Lei 1.102/90, na versão originária, constata-se que O ADICIONAL POR TEMPO DE SERVIÇO DEVE TER COMO BASE DE CÁLCULO A REMUNERAÇÃO TOTAL PERCEBIDA PELOS SERVIDORES PÚBLICOS, não sendo isto o que vem sendo ordenado pelo Poder Público, de vez que os servidores estaduais vêm recebendo o adicional por tempo de serviço, como é fácil constatar empiricamente, sobre o valor do vencimento do cargo efetivo e não sobre a remuneração. A verdade, pois, é que deve ser alterada, por força de decisão judicial, a forma de cálculo do adicional por tempo de serviço, que estava de fato incidindo apenas sobre o vencimento-base (que representa, no mais das vezes, valor inferior ao próprio salário mínimo vigente no País), passando a ser necessariamente calculado sobre a remuneração (que representa o vencimento do cargo efetivo, acrescido das vantagens permanentes e temporárias), o que poderá levar, inclusive, à condenação do Poder Público a pagar aos servidores as diferenças dos últimos 05 anos. Tanto o que se está sustentando é correto e justo1, que houve recentemente a alteração da redação dada àqueles dois dispositivos legais, por força da redação do art. 4º da Lei Estadual nº 2.157, de 26 de outubro de 2000, passando a constar dos mesmos que “o adicional por tempo de serviço é devido por qüinqüênio de efetivo exercício prestado ao Estado, incidente sobre o vencimento base do cargo” (art. 111), e que “o vencimento ou subsídio dos ocupantes de cargos públicos é irredutível” (§ 3º do art. 73). Parece ser indiscutível que o direito dos servidores está de fato protegido pela cláusula constitucional do DIREITO ADQUIRIDO2, sendo verdade que aquela recente alteração legislativa só vem a confirmar que a base de cálculo do adicional por tempo de serviço deve ser a remuneração e não o salário ou vencimento base do cargo. Caso não fosse assim, por que razão o legislador alterou a redação originária da Lei 1.102/90, especialmente quanto à substituição da expressão “remuneração” por “vencimento base do cargo” ? Quanto ao enorme e descabido esforço exegético que certamente será colocado em prática para não pagar o adicional por tempo de serviço de forma correta, cabe, a esta altura, rememorar lição do sábio RUI BARBOSA, patriarca dos constitucionalistas da América Latina, que expressou a firme convicção de que “em presença de um texto claro, preciso, inequívoco, não há que estar argumentando como se nos achássemos ante um enunciado incompleto ou indistinto, do qual houvéssemos de extrair por ilações ou deduções a interpretação mais plausível” (Parecer, na Revista do Supremo Tribunal 9/305, apud PAULO BONAVIDES, “Participação da OAB em todas as fases do concurso de acesso à magistratura”, RTDP 12/41). A lição deste mestre bem se aplica ao que consta deste estudo, onde se procura revelar o que é claro e correto à luz do direito positivo vigente. Cabe revelar, ainda, que o Tribunal de Justiça Estadual já exarou precedente, em julgamento administrativo, que merece ser acolhido em outras demandas, no seguinte sentido: “RECURSO ADMINISTRATIVO – SERVIDOR PÚBLICO – BASE DE CÁLCULO DE ADICIONAL POR TEMPO DE SERVIÇO – INCIDÊNCIA SOBRE A REMUNERAÇÃO – COMPOSIÇÃO – ARTIGOS 73 E 111 DA LEI ESTADUAL 1102/90 – INTERPRETAÇÃO – REAPRECIAÇÃO DE QUESTÃO JÁ DECIDIDA NA ESFERA ADMINISTRATIVA – PROCEDIMENTO REVISIVO – POSSIBILIDADE – PRINCÍPIO DA INFORMALIDADE. “A remuneração é composta de todas as verbas percebidas pelo servidor em retribuição ao seu trabalho, em pecúnia ou não, e, sobre ela incide o adicional por tempo de serviço” (processo nº 109/00, Campo Grande, Rel. Des. ATAPOÃ DA COSTA FELIZ, decisão do Tribunal Pleno3). Constou daquele importante precedente, dentre outras considerações, que também servem de fundamento para este estudo, que: “Para melhor compreensão, deve ser esclarecido que os vocábulos vencimento (no singular), vencimentos (no plural) e remuneração dos servidores públicos não são sinônimos. (…) “De tudo isso deduz-se que a Legislação Estadual é perfeita ao conceituar ‘remuneração’, deixando clara a diferença do termo ‘vencimento’ e é categórica ao estabelecer que o adicional por tempo de serviço incide sobre a remuneração, o que leva à conclusão natural de que esta verba tem sido paga erroneamente aos servidores do Poder Judiciário deste Estado, haja vista que o percentual tem incidido sobre o vencimento-base em se tratando de servidor efetivo, como retratam as informações de f. 79, prestadas pela Diretora do Departamento de Remuneração e Pessoal. “Num segundo passo, vislumbra-se a procedência do pedido também sob a ótica de que o vencimento-base não pode ser inferior a um salário mínimo, haja vista que este já é o mínimo legal. (…) “Por último, há de se considerar que não pode haver tratamento destoante entre questões semelhantes, ou seja, se para os magistrados o cálculo do adicional por tempo de serviço incide sobre o denominado ‘vencimento-base”, acrescido de ‘antecipações’ ou ‘equivalência salarial’, não podem os servidores receberem tratamento desigual” (voto do Relator). Convém lembrar, por fim, que “a melhor interpretação da lei é a que se preocupa com a solução justa, não podendo o seu aplicador esquecer que o rigorismo na exegese dos textos legais pode levar a injustiças” (RSTJ 4/1.554). Espera-se que isto seja observado pelas autoridades que vierem a apreciar o tema ora desenvolvido. 1 Segundo a melhor e mais autorizada doutrina, é louvável a adoção do adicional por tempo de serviço, “pelo sentido de justiça que tal acréscimo representa para aqueles que há mais tempo se dedicam ao serviço público, e nos quais se presume maior experiência e mais eficiência no desempenho de suas funções, o que justifica o acréscimo estipendiário, sem correr os azares de uma eventual promoção” (HELY LOPES MEIRELLES, “Direito Administrativo Brasileiro”, Ed. Malheiros, 2000, 25ª ed., p. 443). 2 A propósito, eis de novo a lição de HELY LOPES MEIRELLES: “Este adicional”, por tempo de serviço, “é irretirável do funcionário precisamente porque representa uma contraprestação de serviço já feito. É uma vantagem pessoal, um direito adquirido para o futuro. Sua “conditio juris” é apenas e tão-somente o tempo de serviço já prestado, sem se exigir qualquer outro requisito da função ou do servidor” (“ob. cit., p. 443). 3 Esta decisão, ao depois, foi cassada por mandado de segurança impetrado pelo Estado de Mato Grosso do Sul, sendo que assim agiu o Tribunal de Justiça por entender que o Sindicato impetrante deve continuar pleiteando a nova forma de calcular o adicional por tempo de serviço na via de ação ordinária em tramitação no Fórum.