Projetos de modernização do Judiciário são apresentados no RJ
Experiências bem sucedidas de informatização e modernização da gestão do Judiciário foram apresentadas e discutidas durante os dias 18 e 19 de setembro, no Rio de Janeiro, durante o seminário Modernização e Administração da Justiça – A Reforma Necessária. O evento foi promovido pelo Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, o Ministério da Justiça, por meio da Secretaria de Reforma do Judiciário, e a Fundação Getúlio Vargas. “A Reforma do Judiciário passa, necessariamente, pela modernização da gestão do setor”, afirmou o secretário de Reforma do Judiciário, Sérgio Renault, ao abrir o evento. Ele lembrou, porém, que a modernização só poderá ser concretizada a contento com autonomia financeira e vontade política nos tribunais. Renault destacou que uma das atribuições da secretaria de Reforma do Judiciário é apoiar e disseminar iniciativas que promovam a modernização da gestão do Judiciário. “Muita coisa pode ser feita, sem alteração de leis ou da Constituição, para melhorar a tramitação de processos e o acesso à Justiça”, lembrou. Ambos os fatores são responsáveis pelo sucesso da informatização do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, que adquiriu autonomia financeira em 1996, com a aprovação de uma lei estadual que criava o Fundo Especial do Tribunal de Justiça. O Fundo é composto por recursos provenientes de custas judiciais, aluguéis e taxas de inscrição de concursos, entre outros, e, a partir de 1999, de 20% das serventias extrajudiciais. O resultado é uma arrecadação mensal, hoje, de R$ 15,8 milhões. Os recursos permitiram a construção e ampliação de fóruns, a informatização e a estruturação da gestão do tribunal. “Com os recursos do Fundo e idéias que não dependem de verbas, estamos fazendo a reforma silenciosa do Judiciário”, disse o presidente do TJRJ, desembargador Miguel Pachá. Hoje, segundo ele, 98% dos órgãos que compõem o TJRJ estão informatizados. Os processos são distribuídos em 24 horas e julgados numa média de 113 dias. Além disso, várias iniciativas implementadas no órgão ajudaram a acelerar a tramitação de processos. Uma delas é o Grupo de Auxílio Mútuo – grupo de juízes que se unem para ajudar um colega momentaneamente sobrecarregado. Há também o mutirão de juízes em comarcas com excesso de processos em atraso. Há poucos meses, em Mangaratiba, exemplificou Pachá, 12 juízes emitiram, em 16 horas, 869 sentenças – quando no ano passado inteiro a comarca julgara 1072 ações. “Precisamos estruturar a Justiça para o século 21”, disse Pachá, ao destacar a necessidade de modernizar a gestão do Judiciário e ampliar as experiências de sucesso para outros tribunais do país. O diretor da Escola de Direito da Fundação Getúlio Vargas, Joaquim Falcão, destacou os objetivos da chamada “Reforma Silenciosa”, como modernizar a gestão do Judiciário, aumentar a satisfação da sociedade em relação ao setor, criar uma rede nacional de modernização judicial, bem como reforçar a imagem pública e a legitimidade do Poder Judiciário. “É necessário, acima de tudo, mobilizar juízes e criar uma cultura interna de participação e inovação nas varas, Juizados e tribunais”, destacou. “Sem isso, dificilmente haverá a modernização”. Para ele, é necessário enfatizar as soluções geradas dentro do próprio Judiciário e levar adiante a modernização a partir da alteração de normas e não das leis. Falcão enfatizou, ainda, que a adesão de tribunais e juízes às propostas de modernização deve ser autônoma. Juizados Especiais, experiência inovadora de Justiça Um dos temas que recebeu destaque no evento foram os juizados especiais. O advogado João Geraldo Piquet Carneiro, atual presidente da Comissão de Ética Pública da Presidência da República e um dos responsáveis pela criação dos Juizados de Pequenas Causas, em 1980, fez um histórico da implementação e da reformulação dos juizados nas décadas de 80 e 90 e pediu cautela com a ampliação excessiva de sua competência. “Os juizados especiais não podem ser usados para atender causas que, embora justas, são incompatíveis com sua estrutura”, disse. A pesquisadora Maria Tereza Sadek, doutora em Ciência Política pela USP e coordenadora do Centro Brasileiro de Estudos e Pesquisas Judiciais (CEBEPEJ), expressou a mesma opinião. “O aumento da competência dos juizados pode colocar em risco sua atuação”, alertou. Para a pesquisadora, embora a criação dos juizados especiais tenham representado “uma reforma de monta do Judiciário” e ainda hoje são “a experiência mais inovadora de acesso à Justiça estatal”, eles continuam distantes da população. Sadek apresentou, no evento, uma pesquisa por amostragem feita pela entidade sobre os juizados especiais de São Paulo. Os resultados mostram que não há celeridade – a média de duração de um processo, entre a audiência inicial e a sentença é de 9 meses. Os reclamantes são, em sua maioria, da classe média e geralmente por questões relacionadas a consumo. Além disso, destacou ela, a maior parte dos conciliadores que atuam nos juizados não tem preparo para tal, são “conciliadores de fachada”. Sadek considera baixo a índice detectado de apenas 24% de sentenças obtidas por meio de conciliação. A pesquisadora criticou o fato de não haver qualquer diagnóstico sobre os juizados especiais no país ou sobre o Judiciário como um todo e elogiou a iniciativa da Secretaria de Reforma do Judiciário, que está realizando uma pesquisa sobre o setor. “O Judiciário brasileiro não se conhece”, afirmou. “As informações que existem são inconsistentes e viciadas”. Ela insistiu pela necessidade de maior transparência do setor. “Qualquer instituição que atue com recursos públicos deve prestar contas à sociedade”, destacou. Por fim, pediu aos juízes que deixem “as vaidades e os bairrismos” de lado e compartilhem experiências bem sucedidas de gestão. Entre as experiências inovadoras de gestão apresentadas no evento está a da Primeira Vara de Araras. O juiz Walter Ariette dos Santos conseguiu a doação, por parte de uma empresa de consultoria em informática, da informatização da vara. Além de agilizar a entrada e a tramitação dos processos no órgão, o sistema permite controlar o trabalho dos funcionários, a rapidez dos processos, identifica gargalos na tramitação e permite o levantamento estatístico de todo o trabalho da vara. No Rio de Janeiro, os 104 Juizados Especiais Cíveis são padronizados e têm a mesma estrutura de informática, segundo explicou a juíza Cristina Tereza Gaulia, do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro. O TJRJ mantém uma comissão de acompanhamento dos juizados, encarregada, entre outras atribuições, de controlar a produtividade dos órgãos. Uma das inovações implementadas no Rio de Janeiro são os Núcleos de Primeiro Atendimento, encarregados de orientar os reclamantes sobre a propositura de processos e garantir o acesso das pessoas à Justiça. A desembargadora Marisa Ferreira dos Santos, do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, apresentou o projeto “Justiça sem Papel”, que funciona nos juizados especiais previdenciários de São Paulo, Ribeirão Preto, Campinas e Mato Grosso do Sul. Ali, o processo tramita de maneira virtual. Há petições padrão para 48 tipos de causas previdenciárias. Para abertura do processo, os documentos do requerente são escaneados e anexados num arquivo com a petição e o processo recebe um número. As datas da audiência e da perícia são automaticamente marcadas, bem como é enviada, por e-mail, a intimação ao réu. Simplicidade e informalidade são levados à sério: testemunhas podem ser citadas por telefone e o requerente pode retificar seu pedido durante a audiência. Em Ribeirão Preto, outra inovação: estudantes de Direito são responsáveis pelo atendimento ao público, por meio de um convênio entre o juizado e uma universidade local. Ali, a sentença ocorre num prazo médio de 60 dias após o início do processo.