OAB-MS desagrava procuradora vítima de prisão arbitrária decretada por juiz
Campo Grande (MS) – Com a chancela unânime de seu Conselho Seccional, a Ordem dos Advogados de Mato Grosso do Sul (OAB-MS), desagravou publicamente na tarde desta sexta-feira (29) a procuradora federal do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) Miriam Noronha Mota Gimenes, que foi vítima de prisão ilegal por ordem do juiz de direito da 2ª Vara da Comarca de Cassilândia, Silvio César do Prado no dia 26 de janeiro deste ano.
A prisão ocorreu devido a um processo de concessão de benefício previdenciário, que tramitou na Vara da Comarca de Cassilândia, e foi julgado favoravelmente à autora. Em seguida, o INSS cumpriu o que deveria: implantou os benefícios previdenciários (aposentadoria por idade) e pagou os atrasados, desde a sentença até o trânsito em julgado da ação. No entanto, quando a autora foi executar o processo, ela cobrou todo o período, inclusive aquele que o INSS já havia pago administrativamente. O advogado do INSS comprovou nos autos ao juiz que parte daqueles valores já haviam sido pagos e que os benefícios já haviam sido implantados.
Frente à insistência da autora em querer receber o que não era mais devido, o juiz determinou que a procuradora-chefe do INSS em Campo Grande, Miriam Gimenez, comprovasse o pagamento administrativo. Em vez de intimar a procuradora processualmente, o juiz mandou um ofício, que acabou sendo arquivado na Procuradoria, justamente pelo fato de o benefício já ter sido pago. Assim, o juiz mandou prender a procuradora, que nunca atuou no processo.
Veja a íntegra do desagravo público lido no plenário do Conselho Seccional da OAB-MS pelo procurador federal Marco Aurélio de Oliveira Rocha, presidente da Comissão do Advogado Público da OAB-MS:
DESAGRAVO PÚBLICO – MIRIAM GIMENEZ – 27.02.2009
Exmo. Sr. Presidente da OAB, Seccional de MS, Dr. FÁBIO RICARDO TRAD,
Exma. Sra. Dra. LENY OURIVES DA SILVA, Procuradora Federal aposentada e Tesoureira da OAB/MS, na pessoa de quem cumprimento toda a Diretoria e esse Egrégio Conselho Estadual,
Diletos colegas Advogados Públicos Federais (Procuradores Federais, Advogados da União, Procuradores da Fazenda Nacional e Defensores Públicos da União),
Senhoras e Senhores:
É com imensa honra que recebo – do Ilustre Presidente, Dr. FÁBIO TRAD – essa nobre missão de vir a essa tribuna representar a advocacia pública, nesse triste episódio de abuso de poder e arbitrariedade vivenciado pela colega Procuradora Federal, Dra. MIRIAM NORONHA MOTA GIMENEZ.
O DESAGRAVO PÚBLICO é um ato solene que a OAB celebra em favor do advogado atingido moralmente, no exercício da profissão e, a um só tempo, em defesa da própria ADVOCACIA.
Preceitua o art. 7º, XVII, da Lei 8.906/94, que “é direito do advogado ser publicamente desagravado, quando ofendido no exercício da profissão ou em razão dela”.
De sua vez, preconiza o art. 18, do Regulamento Geral, que “o inscrito na OAB, quando ofendido comprovadamente em razão do exercício profissional ou de cargo ou função da OAB, tem direito ao desagravo público promovido pelo Conselho competente, de ofício, a seu pedido ou de qualquer pessoa”.
O parágrafo 7º, do mencionado art. 18, do Regulamento Geral diz, ainda, que “o DESAGRAVO PÚBLICO, como instrumento de defesa dos direitos e prerrogativas da advocacia, não depende de concordância do ofendido, que não pode dispensá-lo, devendo ser promovido a critério do Conselho”.
Nas sábias palavras de PAULO LUIZ NETO LOBO, o objetivo do DESAGRAVO PÚBLICO é “tornar pública a solidariedade da classe ao colega ofendido mediante ato da OAB, e o repúdio coletivo ao ofensor”.
Desse modo, o presente DESAGRAVO PÚBLICO tem por objeto amainar, atenuar ou minorar o constrangimento experimentado pela Dra. MIRIAM NORONHA MOTA GIMENEZ, em decorrência da prisão arbitrária, abusiva e ilegal de que foi vítima, exteriorizando a solidariedade de toda a classe de advogados, além de restaurar a imagem e a majestade da ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL, especialmente da SECCIONAL DE MATO GROSSO DO SUL.
Faço questão de frisar que o presente DESAGRAVO PÚBLICO tem o condão apenas de amainar, atenuar ou minorar o sofrimento enfrentado pela Dra. MIRIAM NORONHA MOTA GIMENEZ, uma vez que o dano por ela suportado é irreparável, conforme foi testemunhado por todos os colegas que com ela convivem na Procuradoria Federal Especializada do INSS.
Pois bem, Colendo Conselho Estadual, ao mesmo tempo em que me orgulho da missão que me foi confiada pelo nosso Presidente Dr. FÁBIO TRAD, devo confessar que sou tomado por profunda tristeza, por ter participado deste truculento episódio.
Com efeito, cultos e eminentes CONSELHEIROS, os fatos ora noticiados se sucederam quando ainda se comemorava os 60 (sessenta) anos da DECLARAÇÃO UNIVERSAL DOS DIREITOS HUMANOS, adotada e proclamada pela Assembléia Geral das Nações Unidas, em 10.12.1948, onde foi consagrada, em seu Artigo IX, a garantia de que “NINGUÉM SERÁ ARBITRARIAMENTE PRESO, DETIDO OU EXILADO”.
Os fatos ora narrados, Egrégio CONSELHO, ocorreram sob a égide da CONSTITUIÇÃO CIDADÃ, promulgada em 05.10.1988, que tem como um de seus fundamentos a “DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA”, que tem como direitos e garantias fundamentais os postulados de que “NINGUÉM SERÁ SUBMETIDO A TORTURA NEM A TRATAMENTO DESUMANO OU DEGRADANTE”, que “SÃO INVIOLÁVEIS A INTIMIDADE, A VIDA PRIVADA, A HONRA E A IMAGEM DAS PESSOAS, ASSEGURADO O DIREITO A INDENIZAÇÃO PELO DANO MATERIAL OU MORAL DECORRENTE DE SUA VIOLAÇÃO”.
Conforme já amplamente divulgado, a Dra. MIRIAM NORONHA MOTA GIMENEZ foi presa, por determinação do Juiz de Direito SILVIO CEZAR DO PRAZO, titular da 2ª Vara da Comarca de Cassilândia, em substituição legal, na 1ª Vara daquela Comarca, sob o fundamento de que teria praticado o crime de desobediência.
O suposto crime de desobediência teria sido praticado em uma ação previdenciária, em que a segurada Autora dizia que não havia recebido os valores determinados em sentença, quando o INSS já havia comprovado o pagamento.
Não obstante, a segurada voltou aos autos, informando que não havia recebido os valores, quando o Juiz determinou, por meio de ofício. que o INSS informasse como havia sido feito o pagamento, por procuração ou coisa que o valha.
Esse ofício não foi respondido, o que foi suficiente para que o Magistrado destilasse sua ira, decretando a prisão da nobre colega PROCURADORA FEDERAL, em flagrante abuso de poder.
As ilegalidades são diversas, senão vejamos:
1)O processo civil oferece meios para execução de obrigação de fazer, a propósito do art. 461, do CPC, que prevê o cumprimento de obrigação de fazer, fixando-se multa diária pelo descumprimento de ordem;
2)Não se admite a prisão de natureza penal, determinada por juiz no exercício de jurisdição civil;
3)O crime de desobediência não pode ser praticado por servidor público, uma vez que o sujeito ativo da conduta típica deve ser um particular;
4)O advogado não se confunde com a parte (NESSE PARTICULAR EMÉRITOS CONSELHEIROS, É BOM QUE SE DIGA QUE, NA ÓTICA DA AUTORIDADE JUDICIÁRIA OFENSORA, O ADVOGADO PODE SER PRESO SE SEU CLIENTE NÃO PAGAR ALIMENTOS OU ATÉ MESMO SE O SEU CONSTITUINTE FOR DEPOSITÁRIO INFIEL);
As ilegalidades e arbitrariedades são tantas que ficaríamos horas identificando-as, uma por uma.
O caso teve grande repercussão, tendo sido publicadas diversas notas de desagravo e repúdio, dentre elas importante Nota de Repúdio assinada pela OAB/MS, ANPPREV, ANPAF e UNAFE veiculada no jornal Correio do Estado.
Por último, no dia 20 próximo passado, o Advogado-Geral da União, Dr. JOSÉ ANTONIO DIAS TOFFOLI apresentou reclamação disciplinar ao CNJ, a qual foi entregue em mão ao Ministro GILSON DIPP.
Em via inversa, a autoridade judiciária enviou nota ao site Cassilândia News, com os seguintes dizeres:
“Não existe nada de errado.
O que existe é o cumprimento de ordem judicial, e como representante legítimo do Poder Judiciário, pena de contribuir para o enfraquecimento do Estado Democrático de Direito, não permito de forma alguma que isso ocorra. O instrumento que existe para tais casos, ainda que pífio, módico, dada à gravidade do fato, é o flagrante por desobediência. Sempre o utilizei e sempre o farei porque prometi cumprir a Constituição e as Leis do meu país.”
Essa infeliz nota, publicada no Cassilândia News, revela que a autoridade judiciária defende, com todas as letras, a prática de arbitrariedades.
Importante asseverar que, apesar da ampla divulgação do caso e publicação de diversas notas de desagravo e repúdio, a entidade de classe da magistratura quedou-se silente, ou seja, não tomou partido, o que vem a confirmar os excessos praticados pelo juiz.
Por outro lado, não se pode esquecer que o Magistrado incorreu nas sanções do art. 350, do Código Penal, segundo o qual pratica exercício arbitrário ou abuso de poder ordenar ou executar medida privativa de liberdade individual, sem as formalidades legais ou com abuso de poder.
Incidiu também, pelo mesmo motivo, no art. 4º, I, da Lei 4.898/65, que regula o processo de responsabilidade administrativa, civil e criminal, nos casos de abuso de autoridade.
Por fim, sobre o abuso de poder e de autoridade, o Professor Doutor CANDIDO FURTADO MAIA NETO asseverou que “são delitos graves que lesionam a humanidade” e devem ser tratados como “crimes de potencial ofensivo máximo”.
De efeito, não se pode admitir que, em pleno Terceiro Milênio, em um Estado Democrático de Direito, uma autoridade possa se utilizar de seu cargo, para propagar seu destempero, em prejuízo à liberdade individual do cidadão.
CARA DRA. MIRIAM, RECEBA ESTA MANIFESTAÇÃO DE DESAGRAVO PÚBLICO, COMO ATO DE SOLIDARIEDADE DA ADVOCACIA PÚBLICA, DA ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL E DE SEUS COLEGAS DA AGU.
ESTA CASA, EM SUA MISSÃO CLASSISTA E INSTITUCIONAL, SE COMPADECE DE SEU SOFRIMENTO E SE COLOCA A DISPOSIÇÃO PARA TODA E QUALQUER CONSEQUÊNCIA QUE SOBREVIER DESTE EPISÓDIO, SOLIDARIZANDO-SE E ENFILEIRANDO-SE NA DEFESA DA ADVOCACIA E DA CIDADANIA.
MEU MUITO OBRIGADO!