CFP e OAB pregam “uma sociedade sem manicômios”
“Por uma sociedade sem manicômios! Há 15 anos chegamos a esta conclusão”. É com estas frases que o CFP (Conselho Federal de Psicologia) e a OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) abrem o relatório das inspeções em hospitais psiquiátricos realizadas em 16 estados e no Distrito Federal, no mês passado. “Não obstante as importantes conquistas para o resgate da cidadania do louco, não obstante os mais de 500 serviços substitutivos já existentes no Brasil, ainda existem quase 50 mil leitos psiquiátricos. São milhares de brasileiros presos, sob o pretexto de serem tratados”, condena o texto já na abertura. A CNDH/OAB (Comissão Nacional de Direitos Humanos do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil) apresentou hoje, na sede da OAB em Brasília, o balanço nacional das vistorias do último dia 22, em 38 manicômios do país. “Depois que os relatórios parciais começaram a chegar às nossas mãos eu passei a dizer que, no Brasil, saúde mental é coisa de louco”, afirmou o presidente da CNDH, Edísio Simões Souto. O trabalho foi feito em parceria com a CNDH/CFP (Comissão Nacional de Direitos Humanos do Conselho Federal de Psicologia), coordenada por Marcos Vinícius de Oliveira. Segundo Edísio Souto, o quadro, em quase todos os manicômios visitados “é de extrema preocupação”. O relatório informa que foram encontrados pacientes nús em regiões frias, hospitais tratando doentes mentais como presidiários, em enfermarias fechadas com grades e cadeados, hospitais sem plantões médicos no fim de semana, alguns sem terapeutas ocupacionais, e hospitais sem medicamentos indispensáveis aos tratamentos. “Faz-se de conta que se trata, quando na verdade, sem esses profissionais e sem medicamentos não se está tratando ninguém”, afirma Souto. O relatório final será encaminhado ao Ministério da Saúde. De acordo com o presidente da comissão, o Ministério sinalizou, em nota, que fará inspeção nas unidades psiquiátricas do país. Ainda segundo Souto, diretores de hospitais psiquiátricos reclamam do pagamento do SUS (Sistema Único de Saude) pelas internações nessas unidades e isso também será discutido com o Ministério. O presidente da Comissão de Direitos Humanos da OAB aponta como o maior problema a inexistência de fiscalização nessas unidades hospitalares. “Está faltando fiscalização por parte do SUS, porque o SUS tem uma resolução que estabelece o que uma unidade psiquiátrica tem que ter e nós observamos “in loco” que vários desses ítens não estão sendo cumpridos”, reprova. Sobre a possibilidade de o relatório fortalecer a luta contra essas instituições, Souto disse que a OAB não pode fazer uma avaliação técnica se é favorável ou não a essa luta. Mas “manter pessoas do jeito que nós vimos aí, a OAB passa a ser contra”. Ele admite a internação, “mas com dignidade, com tratamento com medicamentos e, efetivamente, com alguém sendo tratado”. O relatório inclui sugestões ao Ministério da Saúde, entre elas, maior fiscalização, discussão em nível técnico sobre a internação em hospitais psiquiátricos e uma separação nos manicômios entre pacientes com problemas neurológicos e os que são tratados por problemas mentais. O texto é uma amostragem das condições em que se encontram os manicômios em todo o país, infelizmente com notável semelhança entre os estados: negligência, abuso medicamentoso, abandono e negação dos direitos humanos dos pacientes. O trabalho conjunto das Comissões de Direitos Humanos da OAB e CFP em inspeção a unidades psiquiátricas teve início em março deste ano, quando o grupo visitou hospitais psiquiátricos de Pernambuco, onde havia denúncias de mortes seqüenciais em manicômios, e teve ação de repercussão nacional no mês de julho, quando 17 unidades federativas foram auditadas, em ação sigilosa até a sua realização. O resultado foi entregue à sociedade civil hoje, antes de ser encaminhado para o Poder Público.