A PRÁTICA FORENSE NOS CURSOS DE DIREITO

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Luís Antônio Venâncio Prof. Orientador do Núcleo de Prática Jurídica – UNAJUR – UNAES Especialista em Direito Processual Civil e Direito Civil. Ao iniciar a aprendizagem da prática jurídica, o acadêmico conta com um sistema de esquemas que constituirá o alicerce de futuras aprendizagens, oriundo da teoria vista em sala de aula através da didática pedagógica dos professores. Entretanto, há a necessidade de implementação de novos métodos didáticos que conciliem a teoria e a prática do direito, pois há dois problemas que vêm se manifestando. O primeiro diz respeito a rotinização do ensino prático como prática de ensino, problema fundamental que enfraquece a formação acadêmica jurídica nos dias de hoje. Como renovar tais práticas rotineiras e implementar um novo ritmo na Didática do Ensino Jurídico, que melhore a assimilação dos acadêmicos no desenvolvimento da prática jurídica? O segundo diz respeito a áreas de especialização, ou seja, da formação advocatícia, formação acadêmica e formação técnica, sendo de fundamental importância definir qual o tipo de profissional sairá formado. Esses problemas remetem a outros questionamentos: – existe maturidade suficiente para que o acadêmico defina sua formação ainda durante o curso de graduação? – quais os instrumentos colocados pelas Instituições para facilitar essa escolha pelo acadêmico? Mas, para responder a essas questões há necessidade de conhecer como a didática pedagógica na formação de docentes vem sendo desencadeada na disciplina de prática forense cível, junto a esses acadêmicos. Para termos uma melhor visão sobre a sistemática de regulamentação que hoje acontece nos cursos de direito no Brasil, se faz necessário um breve relato histórico desde a norma que o criou até as Portarias atuais. No ano de 1827, mais especificamente no dia 11 de agosto, era fundado o curso de Direito no Brasil. Dom Pedro Primeiro fez as honras, criando os cursos de ciências jurídicas e sociais, um na cidade de São Paulo e o outro na cidade de Olinda e, desde essa época, funcionando em cinco anos. Em português atual, entre os artigos da Lei de criação do Curso de Direito, está o art. 9º, disposto da seguinte forma (1): (1) Livro 170 Anos de Curso Jurídico no Brasil. Recuperação Histórica: A evolução das estruturas curriculares desde a criação dos primeiros cursos jurídicos. Site oab.org.br , 1999 “Os que freqüentarem os cinco anos de qualquer dos cursos, com aprovação, conseguirão o grau de Bacharel. Haverá também o grau de Doutor, que será conferido àqueles que se habilitarem com os requisitos que se especificarem nos estatutos, e só os que obtiverem, poderão ser escolhidos para professores”. No quinto ano do curso, na 2ª Cadeira, era ensinadas a disciplina Teoria e prática do processo adaptado pelas leis do Império. Era a disciplina obrigatória de prática jurídica ensinada para os que quisessem exercer a advocacia. Em 1879, o Decreto nº 7247, reformou o ensino superior em todo o Império. No art. 23, as Faculdades de Direito eram divididas em duas secções: a das ciências jurídicas e das ciências sociais. O grau de Bacharel em Ciências Sociais habilitava, independente de exame, para exercer a função de agente diplomático nas embaixadas, nas secretarias de Estado e nas Repartições Públicas. O grau de Bacharel em Ciências Jurídicas habilitava para a advocacia e a magistratura. Já em 1891, o Decreto nº 12321 H, regulamentava Instituições de Ensino Jurídico, dependentes do Ministério da Instrução Publica, hoje Ministério da Educação. O seu art. 2º, estava assim disposto: “Haverá em cada uma das Faculdades de Direito três cursos: o de Ciências Jurídicas, o de Ciências Sociais, e o de Notariado (escrivão público – tabelião). Desta forma, um único curso de Direito já formava três profissionais, tornando-se um curso de fundamental importância no contexto social da época. Era muito procurado e a sua maioria de acadêmicos era formado por filhos de fazendeiros e grandes comerciantes do sudeste e sul do país em São Paulo e do Norte e Nordeste em Olinda. Logo em seguida, a Lei nº 314 de 30 de setembro de 1895, reorganizava o ensino das Faculdades de Direito. O então Presidente da República dos Estados Unidos do Brasil sancionava tal alteração. Desta feita o curso de direito nos seus cinco anos, já continha em suas disciplinas o conteúdo das três áreas diferenciadas na norma anterior. A disciplina de prática forense continuava em seu último ano, ainda sem o contato com a comunidade, ou com a prática real dos processos. O Decreto nº 11.530 de 18 de março de 1915, novamente reorganizava as Faculdades de Direito na República. Além de alterar a grade curricular, o art. 175 trouxe uma inovação necessária para a época, que o ensino da teoria e prática processual civil, compreenderia também um curso essencialmente prático, em que os alunos aprendessem a redigir atos jurídicos e a organizar a defesa dos direitos. De fundamental importância para a época, no auge da primeira guerra mundial, onde muitos dos direitos das gentes, como eram chamados à época, eram esquecidos. Em 1931, o Chefe do Governo Provisório da República dos Estados Unidos do Brasil, baixava o Decreto nº 19.851, e em seu art. 26 assim determinava: “O ensino do Direito far-se-á na respectiva Faculdade em dois cursos: um de cinco anos, e outro de dois.” Ao estudante aprovado em exames de toda a matéria ensinada no primeiro (cinco anos) era conferido o grau de Bacharel em Direito e o diploma correspondente, ao aprovado em toda a matéria ensinada em qualquer das secções do segundo (dois anos) mais a defesa da tese em referência no art. 50 do mesmo decreto, era conferido o grau de Doutor em Direito, e o diploma correspondente. Desta forma, o aluno que concluísse os sete anos do curso já saía com o título de DOUTOR, daí a convenção para todos os advogados de terem esse pronome de tratamento. Em 1962, um Parecer da Comissão de Ensino Superior do Ministério da Educação indicou algumas disciplinas necessárias a serem fixadas pelo Conselho para o Curso de Direito com duração de cinco anos. Isto em decorrência da Lei de Diretrizes e Bases, em seu art. 70, que determinava que fosse fixado um currículo mínimo para o Direito. Em 25 de fevereiro de 1972, a Resolução nº 03/72 do extinto Conselho Federal de Educação, determinava um currículo mínimo do curso de graduação em Direito, compreendendo matérias básicas e profissionais além de exigir também o estágio supervisionado de prática forense cível e criminal, ainda não introduzido na grade curricular do curso. Nesse período o estágio supervisionado de Direito funcionava da seguinte forma: – o acadêmico passava cinco anos na Faculdade e saía Bacharel em Ciências Jurídicas e Sociais; – se desejasse advogar precisava participar do estágio supervisionado pela OAB nos últimos dois anos do curso, estágio esse que era facultativo e, caso tivesse bom aproveitamento, ganhava o direito de inscrever-se diretamente na Ordem dos Advogados do Brasil, sem a necessidade de passar pelo exame da ordem. – caso o bacharel não participasse do estágio supervisionado, era obrigado a prestar o exame da Ordem para exercer a advocacia. Tal situação foi alterada recentemente com a Lei 8.906 de 04 de julho de 1994, Estatuto da Advocacia, a qual tornou obrigatório o Exame da Ordem para o exercício da advocacia, independente do estágio supervisionado ter sido realizado ou não. Hoje, todos os acadêmicos que quiserem exercer a advocacia após a conclusão do curso precisam necessariamente passar pelo Exame. Por último, a Portaria Ministerial nº 1.886 de 30 de dezembro de 1994, revogou as Resoluções 03/72 e 15/73, fixando novas diretrizes curriculares e o conteúdo mínimo do curso jurídico, tornando obrigatório o estágio de prática jurídica supervisionado pela Instituição de Ensino Superior/OAB e, integrado ao currículo pleno, com carga horária mínima de 300 horas/aula. O que pode-se perceber no decorrer dessas normas por que passou o curso de direito, desde a sua criação, é que ao Bacharel em Direito sempre foi exigido participar da prática jurídica. Hoje, o acadêmico que quer seguir carreira na área jurídica, sendo advogado, juiz, promotor, procurador ou defensor público, tem que passar pelo estágio supervisionado obrigatório de dois anos, um ano na área cível e o outro na área criminal e trabalhista, elaborar monografia, participar de um exame nacional de cursos “provão” senão não recebe o diploma, e, por último, passar no famoso exame de ordem. Somente após, poderá exercer livremente sua profissão. O curso de Ciências Jurídicas e Sociais é bastante extenso e a cada dia tem-se novos direitos e Leis são sancionadas, tanto para excluir como para incluir direitos. Nesse contexto, tal obrigação do estágio faz com que o acadêmico conheça as frentes principais da advocacia se identificando com alguma área de atuação. Acontecendo também com a obrigação da monografia, que o acadêmico amplie suas possibilidades se identificando com uma ou outra área de pesquisa e, inclusive, com a área de ensino. Atualmente, a sociedade vem exigindo dos acadêmicos melhor qualificação, mas para que isso aconteça o docente deve atualizar-se permanentemente como, por exemplo, buscando cursos de mestrado e doutorado. O motivo é óbvio, como informa o próprio MEC, hoje, para cada 500 (quinhentos) acadêmicos de direito no Brasil, temos 1 (um) mestre/doutor. Na maioria das Faculdades do país, temos a figura do profissional, advogado, promotor, juiz, desembargador, procurador, fazendo às vezes do professor, seja por gostarem de ministrar aulas ou por aumentarem seus rendimentos. Raríssimos são os casos em que o professor do Curso de Direito sobrevive somente de seu magistério. Não era assim quando o curso de direito foi criado há 172 anos atrás, os Lentes titulares, como eram chamados os professores do ensino superior, recebiam o ordenado equivalente aos Desembargadores e gozavam das mesmas honras. Podendo inclusive aposentar-se com o ordenado por inteiro após 20 anos de serviço (Site oab.org.br, 1999). A disciplina de prática jurídica sob a forma de estágio supervisionado, agora fazendo parte do currículo de todas as faculdades de direito, exige que o profissional dessa importante disciplina esteja em constante aperfeiçoamento, quer nas técnicas de pesquisa, nas técnicas de elaboração das petições, nas técnicas da mediação, e principalmente nas técnicas didático-pedagógicas, pois, tal estágio não objetiva simplesmente a prestação de serviços, mas proporciona principalmente, a complementação do ensino e da aprendizagem. As mudanças no desenho do currículo em ações voltadas às atividades práticas sob a modalidade de estágio supervisionado vêm reforçar a necessidade não só de estudar como a formação de professores na sua didática pedagógica vem sendo ministrada e como esse conhecimento teórico-prático contribui na formação do acadêmico de direito. Na concepção da Lei a formação do futuro profissional de direito, inclui o estágio como uma complementação do processo educacional, em que proporciona ao acadêmico o desenvolvimento de potencialidades, além de humanizá-lo, no trato com os assistidos, abrindo a mente do aluno para o exercício do pensamento lógico. É de fundamental importância na formação do docente que se identifique como se deve ensinar numa sociedade em plena mudança. A imediata absorção pelos docentes de novas metodologias de ensino, combinando com novas técnicas, principalmente as que visam à humanização e desenvolvimento do raciocínio acadêmico devem proporcionar mais estímulos e aprimoramento do exercício das práticas no estágio supervisionado. Atualmente o que tem preocupado os docentes é que muitas Instituições trabalham com a informação vertical, ou seja, de cima para baixo, e ainda utilizando-se de “modelos”, petições pré-impressas, onde o acadêmico só tem o trabalho de completar o texto no computador, sem qualquer preocupação com os FATOS a serem narrados, com a DOUTRINA formada pelos autores clássicos, com a JURISPRUDÊNCIA dos Tribunais sobre o caso, com o DIREITO, e principalmente com o PEDIDO a ser feito. Desse modo, tais “modelos” tolhem a capacidade de raciocínio dos acadêmicos, engessam o potencial de pesquisa e de criatividade que deveria ser aplicado em cada caso concreto. Assim, a escassez de publicação de experiências profissionais de conhecimentos práticos sobre método de ensino-aprendizagem na elaboração de peças processuais e de pesquisa acadêmica na disciplina didática pedagógica da formação de professores voltados a área jurídica, justifica-se o estudo da didática pedagógica na formação de professores que orientam a prática forense cível aos acadêmicos do curso de direito, pois é de suma importância que os professores orientadores dos cursos de direito, que atuando em Núcleos de Prática Jurídica, tenham esse conhecimento para que possam derrubar esses “modelos”, fomentando o trato humanizado com os assistidos, comprometendo-se com mudanças, visando dar aos acadêmicos além da criatividade, estímulo para uma iniciativa investigativa sobre um caso real. Para melhoria do ensino deve-se analisar a prática pedagógica que vem sendo utilizada pelos professores orientadores do estágio supervisionado relativa a disciplina de prática jurídica nas faculdades de direito. Além de identificar as novas técnicas como elaboração de peças processuais e de métodos de como ensinar, e o quê ensinar, dentro da Didática de Ensino Jurídico deve-se confrontar essas técnicas e esses métodos com o desenvolvimento do acadêmico no raciocínio lógico jurídico durante a prática forense cível em seu estágio supervisionado. Espera-se, ao concluir os estudos que os resultados possam oferecer pistas que venham subsidiar os docentes orientadores não só na sua formação como professores que atuam no estágio supervisionado, como também em trazer melhorias na formação do acadêmico do curso de direito. BIBLIOGRAFIA: BASTOS, Aurélio Wander. O ensino jurídico no Brasil. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 1998. 371p. CATANI, Denise Barbosa (org). 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