ARTIGO: O Processo Administrativo e o Direito da Ampla Defesa - A Indispensabi

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Sabido que dentre os direitos individuais assegurados pela Carta Magna Pátria, o constituinte federal nela consagrou o AMPLO DIREITO DE DEFESA.

Com efeito. Prescreve a Constituição Federal em seu artigo 5 o., inciso 55 que :

“Aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e a ampla defesa, com os meios e os recursos a ela inerentes.”


A disposição constitucional transcrita é muito clara e muito abrangente, permitindo-se concluir, de plano e sem sombra de dúvidas, de que, em qualquer procedimento administrativo está assegurado ao servidor público investigado o DIREITO DA AMPLA DEFESA, sem restrições de qualquer natureza.


Resta indagar se no cotidiano a norma é respeitada e posta em prática pelos agentes públicos e políticos, principalmente quando se promove a investigação de ilícitos administrativos por aqueles cuja competência vem prevista na legislação vigente.


Pode ocorrer, e isto se percebe em procedimentos administrativos, disciplinares ou não, que o agente público encarregado da investigação ao se deparar com a defesa do servidor público investigado, constata que o mesmo ao desenvolver sua tese de defesa requer, para comprovação do alegado, a produção de várias provas, entre elas a testemunhal e a documental, e aquele, às vezes, apesar de ser conhecedor profundo das leis, posto que um operador do direito, não defere a produção de prova documental, atropelando, assim, de forma abrupta e violenta aquele DIREITO DA AMPLA DEFESA.


Daí porque medidas judiciais são interpostas com pleno sucesso para correção dessa violência administrativa, a fim de que se respeite o direito líquido e certo do princípio constitucional da ampla defesa.


E mais, por vezes o agente público investigador se exaspera, se enerva, se descontrola pela simples presença do advogado, defensor dos direitos daquele servidor público investigado, chegando, por vezes, ao cúmulo do desrespeito pessoal ao advogado que promove a defesa do servidor público de possível prática de ilícito administrativo.

Vê-se, pois, que a presença do advogado constituido pelo servidor público investigado incomoda, e muito, o agente público investigante.


Inimaginável a inobservância da norma constitucional, garantidora do mais comezinho princípio de direito e de garantia constitucional do cidadão, de estar sempre assistido e defendido em qualquer procedimento judicial ou administrativo por um ADVOGADO LEGALMENTE CONSTITUIDO.


A INDISPENSABILIDADE DA PRESENÇA DO ADVOGADO NOS PROCEDIMENTOS JUDICIAIS E/OU ADMINISTRATIVOS, vem explicitamente referida na Constituição Federal (artigo 133) e no Estatuto da ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL (Lei nº 8.906,de 4 de julho de 1994).


Desnecessário buscar o socorro de exegetas para se compreender com bastante clareza que o advogado, e tão somente o advogado regularmente inscrito na Ordem dos Advogados do Brasil, tem o direito de proceder na forma acima esposada, afim de que com tais prerrogativas, exclusivas do advogado, a disposição constitucional do DIREITO DA AMPLA DEFESA não se transforme em norma sem eco no campo do Direito para a boa administração da justiça e para o respeito aos direitos individuais do cidadão, em especial do servidor público, mas sim, transformando-se em um dos pressupostos básicos do VERDADEIRO ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO.


O festejado constitucionalista ALEXANDRE DE MORAES, em sua procurada obra CONSTITUIÇÃO DO BRASIL INTERPRETADA, Ed. Atlas AS, 7ª. Edição 2007, páginas 313 e seguintes ensina com muita propriedade que :


“A Constituição Federal de 1988 incorporou o princípio do devido processo legal, que remonta à Magna Charta Libertatum de 1215…O devido processo legal configura dupla proteção ao indivíduo, atuando tanto no âmbito material de proteção ao direito de liberdade e propriedade quanto no âmbito formal, ao assegurar-lhe paridade total de condições com o Estado-persecutor e plenitude de defesa (DIREITO Á DEFESA TÉCNICA, à publicidade do processo, à citação, À PRODUÇÃO AMPLA DE PROVAS, de ser processado e julgado por juiz competente, aos recursos, à decisão imutável, à revisão criminal).


Grifei.

Prossegue o eminente mestre ensinando que:

“O devido processo legal tem como corolários a AMPLA DEFESA e o CONTRADITÓRIO, que deverão ser assegurados aos litigantes, em processo judicial criminal e civil ou em PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO, inclusive nos militares.”

Grifei, de novo.

E finaliza o festejado mestre que :

“Por ampla defesa entende-se o asseguramento que é dado ao réu de condições que lhe possibilitem trazer para o processo todos os elementos tendentes a esclarecer a verdade ou mesmo de calar-se, se entender necessário, enquanto o contraditório é a própria exteriorização da ampla defesa, impondo a condução dialética do processo ( par conditio), pois a todo ato produzido caberá direito da outra parte de opor-se-lhe ou de dar-lhe a versão que lhe convenha, ou, ainda, de fornecer uma interpretação jurídica diversa daquela feita pelo autor.”


Por oportuno, permito-me observar que, em tempos pretéritos em sede de Mandado de Segurança nº 2007.020984-3, tendo como impetrante a OAB/MS, verifiquei no excelente voto do eminente Des. ROMERO OSME DIAS LOPES que aquela PRERROGATIVA foi consagrada, voto cuja íntegra foi divulgada pelo site da nossa valorosa Ordem.

No entanto as duas maiores Casas de Justiça de nosso país entendem de formas díspares sobre a presença do advogado no processo administrativo.

Com efeito, o SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA entende que:

“Súmula 343: É obrigatória a presença de advogado em todas as fases do processo administrativo disciplinar.”

Já por sua vez o SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL editou a Súmula Vinculante n° 5, dispondo que:

“A falta de defesa técnica por advogado no processo administrativo disciplinar não ofende a Constituição.”


O posicionamento do subscritor destas anotações jamais poderá se contrapor ao entendimento do PRETÓRIO EXCELSO, posto que esta é tida como a última palavra, e portanto, há que se respeitá-la.

Com a devida vênia, não consigo alcançar como a falta de defesa técnica não poderá afetar o DIREITO DA AMPLA DEFESA.

O servidor público investigado, por ser leigo no manejo das letras jurídicas, não tem o condão de promover sua defesa técnica, posto que não dispõe do preparo intelectual para tanto.

Hipoteticamente veja-se que, em determinado procedimento administrativo disciplinar a autoridade pública investigante faz juntar nos respectivos autos, por exemplo, uma prova colhida de forma ilícita, fazendo com que o investigado, que não dispõe de conhecimentos técnicos necessários, por ser leigo, não impugna a produção daquela prova, que, ao final, por ocasião de seu julgamento, poderá vir em seu prejuízo, o que não ocorreria se houvesse em sua defesa a pessoa do profissional habilitado, ou seja, do advogado.

Com todo o respeito à nossa mais alta CASA DE JUSTIÇA DO BRASIL, e digo isto de pé, não disponho de saber jurídico suficiente para entender a motivação daquela vedação, qual seja, “a falta de defesa técnica por advogado no processo administrativo disciplinar não ofende a Constituição”.

E como fica o DIREITO DA AMPLA DEFESA ?

Como ensina ALEXANDRE DE MORAES, na lição retro transcrita, se o devido processo legal não prescinde do DIREITO DA AMPLA DEFESA, e se este não dispensa um de seus componentes, qual seja a DEFESA TÉCNICA, cria-se indubitavelmente um obstáculo momentaneamente intransponível, e que poderá advir em prejuízo irreparável do investigado.

Por fim busco nas palavras do mestre CELSO ANTONIO BANDEIRA DE MELLO a grande lição:


“… estão aí consagrados, pois, a exigência de um processo formal regular para que sejam atingidas a liberdade e a propriedade de quem quer que seja e a necessidade de que a Administração Pública, antes de tomar decisões gravosas a um dado sujeito, ofereça-lhe oportunidade de contraditório e de defesa ampla, no que se inclui o direito de recorrer das decisões tomadas ( Curso de Direito Administrativo. 11. ed.São Paulo. Malheiros, 1999, p. 71).”

No entanto o CONSELHO FEDERAL da valorosa ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL, vigilante como sempre e de maneira oportuna, já encaminhou pedido ao SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL para que, reexaminando a matéria objeto da Súmula Vinculante nº 5, haja a possibilidade futura de sua revogação.

Posta a matéria sob tal enfoque, há que se aguardar que a dinâmica do direito evoluirá no sentido de se respeitar sempre o devido processo legal e o direito da ampla defesa, sustentáculos indispensáveis do ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO.


Por estas razões, concluo que ao servidor público investigado, em procedimento administrativo, de qualquer natureza, é assegurado o DIREITO DA AMPLA DEFESA e a presença do advogado, para elaboração de sua defesa técnica, é indispensável, visto que este tem o inalienável direito, se constituído for, de intervir, resguardadas integralmente suas prerrogativas e direitos.

Submetendo-me à elevada apreciação de meus ilustres leitores, possuidores de mais suporte intelectual e de maior base de conhecimentos da matéria em debate, entendo que há de se respeitar, a todo custo, as disposições constitucionais vigentes e norteadoras do tema.

E a valorosa Ordem dos Advogados do Brasil neste passo desempenha papel de fundamental importância na defesa de tais postulados.

(*Carlos Bobadilla Garcia é promotor de justiça aposentado e advogado militante na Comarca de Corumbá)