DA CONSTITUCIONALIDADE DO "SAT"
Marco Aurélio de Oliveira Rocha Procurador da Previdência Social em Mato Grosso do Sul [email protected] I. DOS CONTORNOS DA QUESTÃO Ultimamente, tem-se deparado nos tribunais, com inúmeras demandas propostas pelos contribuintes, objetivando o afastamento da eficácia do art. 22, inciso II da Lei nº 8.212/91, que desenha a regra-matriz ou hipótese de incidência tributária da contribuição complementar para financiamento da aposentadoria especial (arts. 57 e 58 do Plano de Benefícios), bem como das prestações derivadas de acidente do trabalho, denominada Seguro de Acidente do Trabalho-SAT. Para tanto, acusam de ilegal o regulamento do mencionado dispositivo legal, isto é, o art. 202 do novel Dec. 3.048, de 6.5.99 – originado do art. 26 do Dec. 2.173/97, que, por sua vez, originou-se do art. 26 do Dec. 612/92, pois entendem que o preceito regulamentar invade seara coberta pelo manto da reserva legal. Acusam, ainda, de inconstitucional a própria norma legal, instituidora da contribuição. Como argumentação básica, asseveram que: a) a expressão “folha de salários” tem alcance menor que a utilizada pela lei, isto é, “total da remuneração paga”; b) há ofensa ao art. 195, § 4º e 154, inciso I, ambos da CF/88 (nova fonte custeio inserida por lei ordinária e utilização da mesma base de cálculo e fato gerador da contribuição prevista no art. 195, I da Carta Magna); c) o critério da atividade preponderante da empresa não pode servir para a determinação da alíquota da contribuição; d) a definição do grau de risco não pode ser feita por decreto. Insurgem-se, derradeiramente, contra o aumento da alíquota do SAT determinado pela Lei nº 9.732, de 11 de dezembro de 1.998, que impingiu nova redação ao § 6º do art. 57 do Plano de Benefícios (Lei nº 8.213/91), acrescentando, ainda, os §§ 7º e 8º. II. DO DIREITO II.1. DO ARQUÉTIPO CONSTITUCIONAL – FUNDAMENTO DE VALIDADE DA EXAÇÃO Primeiramente, é imperioso estabelecer qual o fundamento constitucional para instituição da contribuição social “complementar” para financiamento da aposentadoria com base em tempo de serviço especial (trabalho penoso) e em virtude de acidente de trabalho. Aduzem os contribuintes, que o SAT deveria ser instituído por lei complementar e não poderia ter a mesma base de cálculo da contribuição sobre a folha de salários, face o preceito do art. 195, § 4º da CF/88, que remete o intérprete à norma do art. 154, inciso I, também da Lei Maior. Vejamos a dicção do mencionado dispositivo constitucional, in verbis: “Art. 195. A seguridade social será financiada por toda a sociedade, de forma direta e indireta, nos termos da lei, mediante recursos provenientes dos orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, e das seguintes contribuições sociais: I – do empregador, da empresa e da entidade a ela equiparada na forma da lei, incidentes sobre: a folha de salários e demais rendimentos do trabalho pagos ou creditados, a qualquer título, à pessoa física que lhe preste serviço, mesmo sem vínculo empregatício; a receita ou o faturamento; o lucro; (inciso I com redação dada pela EC 20/98) II – do trabalhador e dos demais segurados da previdência social, não incidindo contribuição sobre aposentadoria e pensão concedidas pelo regime geral de previdência social de que trata o art. 201; (inciso II com redação dada pela EC 20/98) III – sobre a receita de concursos de prognósticos. … § 4º A lei poderá instituir outras fontes destinadas a garantir a manutenção ou expansão da seguridade social, obedecido o disposto no art. 154, I.” Por sua vez, reza o art. 154, inciso I: “Art. 154. A União poderá instituir: I – mediante lei complementar, impostos não previstos no artigo anterior, desde que sejam não-cumulativos e não tenham fato gerador ou base de cálculo próprios dos discriminados nesta Constituição; …” Assim, no açodado entendimento dos contribuintes, o SAT deveria ser instituído por lei complementar e não poderia ter o mesmo fato gerador e base de cálculo da contribuição sobre a folha de salários. Sucede, entrementes, que a contribuição para financiamento do SAT é mera “complementação” da contribuição sobre a folha de salários, uma vez que o legislador pretendeu tributar de forma mais contundente as empresas que, por sua vez, mais oneram a Seguridade Social. De se verificar que o legislador poderia criar alíquotas diferenciadas para o inciso I do art. 22 da Lei nº 8.212/91, sendo 21 (vinte e um), 22 (vinte e dois) e 23% (vinte e três por cento), conforme o grau de risco, mas, por uma questão de técnica legislativa, preferiu dividir nos incisos I e II, consoante se extrai da leitura do dispositivo em comento. Será que por este simples motivo de técnica redacional a “complementação” pode ser considerada inconstitucional? Indispensável invocar-se o alerta que fizera JOSÉ SOUTO MAIOR BORGES, verbis: “… A doutrina brasileira do Direito Tributário mostra-se ávida de inconstitucionalidades. Até parece que a lei deva presumir-se inconstitucional até demonstração em contrário…” (A Constitucionalidade do Salário-Educação – Lei 4.440/64 e Legislação Superveniente, in Revista Dialética de Direito Tributário, 45/108). Anote-se, ainda, que a contribuição do SAT não constitui nova fonte de custeio, mas contribuição recepcionada pela Constituição de 5.10.88, de modo que não é “outra” fonte de custeio destinada a “manutenção” ou “expansão” da Seguridade Social, mas tão-somente “complementação” da contribuição sobre a folha de salários. Via de conseqüência, não há se falar em lei complementar, muito menos em cumulatividade, pois a contribuição do SAT consiste em mero “complemento” da contribuição sobre a folha de salários. Registre-se, para ilustrar, que não existe um “caixa” diferenciado para os benefícios relacionados com atividade penosa ou acidente do trabalho, muito menos uma gestão específica destes fundos, o que corrobora a afirmação de que o SAT é mero “complemento” da contribuição sobre a folha de salários, afastando qualquer dúvida sobre a questão. II.2. DO ALCANCE DA EXPRESSÃO FOLHA DE SALÁRIOS – COTEJO COM A EXPRESSÃO TOTAL DA REMUNERAÇÃO PAGA – LEI COMPLEMENTAR Nº 84/96 Por outra banda, é de se admitir que antes da edição da Lei Complementar nº 84/96, a incidência do SAT na remuneração de autônomos, administradores e empresários é bastante questionável em face da decisão proferida na ADIn 1.102-2/DF. Com efeito, se o Supremo Tribunal Federal declarou inválida a contribuição previdenciária incidente sobre a remuneração paga a “autônomos”, “administradores” e “empresários” é de se concluir que sobre estas mesmas bases de cálculo não poderia incidir o complemento do SAT. Sucede, entrementes, que a discussão do tema sob este prisma se limita ao lapso temporal anterior à LC 84/96, eis que com a edição deste Diploma Legal o vício apontado pelo Excelso Pretório foi redimido. Assim, atualmente, não há vicio que macule a contribuição em apreço, restando para o contribuinte pleitear a repetição daquilo que recolheu indevidamente a título de SAT, se ainda não o fizera. Registre-se, por oportuno, que aquelas empresas que efetuaram a compensação dos valores recolhidos a título de contribuição previdenciária incidente sobre a remuneração paga a “autônomos”, “administradores” e “empresários”, também já fizeram a compensação do respectivo SAT, pois, como se vira, esta contribuição é mero complemento daquela. Na mesma esteira, os créditos tributários cujos fatos geradores são anteriores à vigência da LC 84/96, que já foram depurados em virtude da Portaria MPAS nº 3.081, de 12 de março de 1.996, isto é, já foram abatidos os valores indevidos, também não há se falar em SAT, pois no momento que o crédito relativo à contribuição indevida foi extirpado, assim o fora o respectivo SAT, que lhe é mero acessório. De qualquer sorte, o Colendo STJ já decidiu, através da 1ª Seção Cível (EResp nº 164.522/SP), que o contribuinte deve comprovar a não transferência do encargo financeiro para o custo do bem ou serviço oferecido à sociedade. II.3. HIPÓTESE DE INCIDÊNCIA PREVISTA NO PLANO DE CUSTEIO – FUNÇÃO MERAMENTE EXPLICATIVA DO DECRETO – REGULAMENTO DE EXECUÇÃO De outro turno, não merecem prosperar os argumentos de que é o regulamento quem estipula a alíquota da exação, eis que a regra-matriz está totalmente prevista na Lei nº 8.212/91, que desenha todos os contornos de seu campo de incidência. Senão vejamos a letra do art. 22 da Lei nº 8.213/91: “Art. 22. A contribuição a cargo da empresa, destinada à Seguridade Social, além do disposto no art. 23, é de: I – vinte por cento sobre o total das remunerações pagas, devidas ou creditadas a qualquer título, durante o mês, aos segurados empregados que lhe prestem serviços, destinados a retribuir o trabalho, qualquer que seja a sua forma, inclusive as gorjetas, os ganhos habituais sob a forma de utilidades e os adiantamentos decorrentes de reajuste salarial, quer pelos serviços efetivamente prestados, quer pelo tempo à disposição do empregador ou tomador de serviços, nos termos da lei ou do contrato ou, ainda, de convenção ou acordo coletivo de trabalho ou sentença normativa. (Redação dada pela Lei nº 9.528, de 10.12.97) II – para o financiamento do benefício previsto nos arts. 57 e 58 da Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991, e daqueles concedidos em razão do grau de incidência de incapacidade laborativa decorrente dos riscos ambientais do trabalho, sobre o total das remunerações pagas ou creditadas, no decorrer do mês, aos segurados empregados e trabalhadores avulsos: (Redação dada pela Lei nº 9.732, de 11.12.98) a) 1% (um por cento) para as empresas em cuja atividade preponderante o risco de acidentes do trabalho seja considerado leve; b) 2% (dois por cento) para as empresas em cuja atividade preponderante esse risco seja considerado médio; c) 3% (três por cento) para as empresas em cuja atividade preponderante esse risco seja considerado grave.” De se observar que no dispositivo estão definidos todos os critérios da regra-matriz de incidência, como, v.g., o critério material (ação = verbo + complemento); o critério pessoal (sujeito ativo + sujeito passivo); o critério temporal (…durante o mês…); o critério quantitativo (base de cálculo + alíquota). O critério espacial está definido no próprio arquétipo constitucional, ou seja, o território brasileiro (art. 195, caput: … toda a sociedade…). Assentadas estas premissas, é de se deter a atenção sobre o critério quantitativo, mais especificamente sobre a alíquota, elemento que está na alça de mira dos contribuintes. Sói, no entretanto, que, ao contrário do que dizem os súditos, “a lei” estipulou expressamente as alíquotas da contribuição para financiamento do SAT (1, 2 e 3%), não restando ao regulamento nada mais que permitir a fiel execução do dispositivo legal, consoante o permissivo do art. 84, inciso IV da Carta Magna. Por assim dizer, certo é que “a lei” estipulou, expressamente, os 03 (três) níveis de grau de risco (leve, médio e grave), adotando como critério a atividade preponderante da empresa. Desse modo, a hipótese de incidência restou totalmente delineada pelo dispositivo legal, restando ao regulamento – instituído por decreto – apenas aclarar a norma já desenhada pela lei, aliás, peculiar incumbência desse tipo de ato normativo. Trata-se, pois, de “regulamento de execução”, isto é, aquele destinado a dar plena eficácia à lei, dentro dos limites por ela estabelecidos, consoante preceito do já mencionado art. 84, inciso IV da Constituição Federal. A propósito, vejamos o magistério de ROQUE ANTÔNIO CARRAZZA: “… Em suma, os regulamentos, no Brasil, devem, apenas, executar a lei. Também em matéria tributária, o único regulamento aceito por nossa Constituição é o executivo, que, subordinando-se inteiramente à lei (lato sensu), limita-se a prover sua fiel execução, isto é, a dar-lhe condições de plena eficácia, sem, porém, criar ou modificar tributos” (Curso de Direito Constitucional Tributário, 9ª edição, Malheiros, 1997, p. 225). Anote-se que a lei estabeleceu as alíquotas a serem aplicadas, determinando os critérios que deveriam ser observados, sendo que o regulamento somente veio definir, de forma mais clara, o que seria risco leve, médio e grave, para mitigar os parâmetros da discricionariedade administrativa, em franco benefício do próprio contribuinte. Assim, não fica ao talante do Fisco definir o que é grau de risco leve, médio e grave, mas o regulamento o fez previamente, delimitando, ainda mais, a discricionariedade do agente fiscal. Neste particular, de se invocar mais uma vez, o escólio de CARRAZZA: “Além disso, a lei tributária a ser regulamentada deve comportar, sem exceções, discricionariedade administrativa. Com o regulamento, o Executivo reduz, discricionariamente, o campo de ação que a lei lhe traça, dando a todos um maior grau de certeza quanto às providências que adotará em cada caso concreto” (op. cit., p. 229). Não se venha argumentar que está-se olvidando que o tributo deva ser cobrado mediante atividade administrativa plenamente vinculada (art. 3º do CTN). De efeito, o que se defende aqui é apenas que o conceito do que seja risco leve, médio ou grave pode ser esclarecido por regulamento. Neste diapasão o magistério de HUGO DE BRITO MACHADO, in verbis: “… Aliás, não existe atividade inteiramente vinculada, como não existe também atividade inteiramente discricionária. De qualquer forma, ressalta, claro do conceito de tributo que a cobrança há de ser feita na oportunidade, pela forma e pelos meios estabelecidos na lei, sem que à autoridade caiba decidir se cobra de fulano e deixa cobrar de beltrano, por este ou por aquele motivo. Ou o tributo é devido, nos termos da lei, e neste caso há de ser cobrado, ou não é devido, também nos termos da lei, e neste caso não será cobrado. Seja como for, qualquer vaguidade conceitual, qualquer indeterminação do texto da lei, deve ser superada pela autoridade administrativa mediante a edição de norma, de sorte a evitar a pluralidade de entendimentos por parte de seus diversos agentes. Isto realiza o objetivo da regra definidora de tributo, além de realizar também o princípio da isonomia, evitando tratamento desiguais de situações idênticas” (Curso de Direito Tributário, 13ª edição, Malheiros, 1998, p. 45). Observe que a ensinança do mestre cearense encaixa como uma luva no caso em apreço, pois a regulamentação do texto legal se deveu à nada mais que a uma possível vaguidade conceitual das expressões “risco leve, médio ou grave”. Por via inversa, é de se ter presente que se o Poder Executivo não tivesse editado o regulamento, a norma deveria ser aplicada da mesma forma, pois não é concebível que a inércia do chefe do Executivo possa impedir a vigência de lei. Via de consectário, caso o Poder Judiciário venha a se pronunciar no sentido de declarar a ilegalidade do Regulamento, o que se admite apenas para argumentar, não impedirá a incidência da lei. Assim, os contribuintes se sujeitarão à alíquota que o Fisco entender adequada, dentro dos parâmetros traçados pela lei, conforme o grau de risco. Por derradeiro, ainda que não se permita a eventual utilização das alíquotas de 2 (dois) e 3% (três por cento), ad argumentandum tantum, é inconcebível que o Judiciário conceda uma isenção tributária, por via oblíqua, porquanto se deverá observar, pelo menos, a alíquota mínima, de 1% (um por cento). Desse modo, os empregadores que estão sujeitos à alíquota de 1% (um por cento), sequer têm interesse processual no questionamento do SAT, pois não há como se eximir do cumprimento da obrigação, ao menos no patamar mínimo. II.4. DA ADOÇÃO DO CRITÉRIO DA ATIVIDADE PREPONDERANTE – RAZÃO DE DISCRÍMEN VÁLIDA As diferenças de alíquotas, segundo o grau de risco, têm como fundamento o fato de que a empresa que, preponderantemente, submete seus empregados a um “grau de risco” maior, tem um potencial maior de onerar a Seguridade Social. Pois este é o fundamento lógico do discrímen. Com efeito, o legislador nada mais fez que tratar os desiguais com desigualdade, adotando razão de discrímen válida perante a ordem jurídica, fazendo valer o princípio constitucional da isonomia. A respeito, a lição de CELSO ANTÔNIO BANDEIRA DE MELLO: “… Esclarecendo melhor: tem-se que investigar, de um lado, aquilo que é erigido em critério discriminatório e, de outro lado, se há justificativa racional para, à vista do traço desigualador adotado, atribuir o específico tratamento jurídico construído em função da desigualdade afirmada. … Então, no que atina ao ponto central da matéria abordada procede afirmar: é agredida a igualdade quando o fator diferencial adotado para qualificar os atingidos pela regra não guarda relação de pertinência lógica com a inclusão ou exclusão no benefício deferido ou com a inserção ou arredamento do gravame imposto.” (Conteúdo Jurídico do Princípio da Igualdade, 3ª edição, Malheiros, 1993, p. 38). Assim, o legislador adotou como razão de discrímen o critério do “grau de risco”, haja vista que as empresas que oferecem maior risco para seus empregados, acabam por onerar mais a Seguridade Social, pois têm um potencial muito maior de causar e causam um número muito maior de acidentes do trabalho, além de causar a aposentação prematura dos mesmos, por submetê-los a trabalho insalubre ou perigoso (arts. 57 e 58 do Plano de Benefícios). Apenas para ilustrar, oportuno lembrar que a construção civil é a atividade que mais causa acidentes do trabalho, sendo, por corolário lógico, a atividade que mais rende ensejo à instituição de auxílio-doença, aposentadoria por invalidez e pensão por morte, de modo que está sujeita à alíquota complementar de 3% (três por cento). De outro turno, impende observar que a base de cálculo do SAT é o montante da “remuneração paga pela empresa” e não o “salário do empregado”, de modo que não há se personalizar, compulsoriamente, a contribuição, empregado por empregado, como querem, sofisticamente, os contribuintes. Frise-se que o discrímen tem que ser observado de empresa para empresa, que é o sujeito passivo da exação, e não de empregado para empregado. E, segundo a lição de CELSO ANTÔNIO BANDEIRA DE MELLO supra, o critério é válido, pois a norma guerreada desequipara situações jurídicas desiguais, ou seja, as próprias empresas, sujeitos passivos da contribuição social. Não dissente a jurisprudência do Egrégio TRF/1ª Região, in verbis: “E M E N T A: TRIBUTÁRIO. CONTRIBUIÇÃO SOCIAL. SEGURO DE ACIDENTE DO TRABALHO. AFERIÇÃO DOS GRAUS DE RISCO DAS ATIVIDADES. SISTEMÁTICA LEGAL. 1. A contribuição para o seguro de acidente do trabalho (SAT), calculada pelo grau de risco (leve, médio e grave) da atividade preponderante da empresa (aquela que tem o maior número de empregados), e não de cada estabelecimento, não maltrata o princípio constitucional da igualdade tributária (art. 150, II – CF), pois a mesma regra é aplicada a todos os contribuintes. (Cf. Lei nº 8.212, de 24/07/91, art. 22, inciso II; e Decreto nº 2.173, de 05/03/97, art. 26). 3. Provimento da apelação e da remessa oficial” (AMS 1998.01.00.055407-0/DF – Rel. Juiz OLINDO MENEZES – 3ª Turma – j. 9.12.98 – DJ 9.4.99, p. 197 – v.u.) Do corpo do voto do relator, acompanhado unanimemente pelos pares, extrai-se, por oportuno, a seguinte lição: “… Entendo que a sistemática legal não contém ofensa ao princípio de igualdade tributária, pois a lei trata as empresas do mesmo ramo de modo isonômico. A falta de distinção dentro de cada empresa, em razão de eventuais peculiaridades e particularidades dos seus estabelecimentos, igualmente não tipifica ilegalidade. O legislador adotou o critério da atividade preponderante da empresa – aquele que tem maior número de empregados – para aferir o grau de risco de acidente do trabalho, numa opção política legislativa fiscal e extra fiscal que não pode ser alterada pelo Juiz, que não é legislador, para impor aferição em relação a cada estabelecimento, a menos que houvesse distinção tributária arbitrária entre situações jurídicas iguais. …” Mais recentemente, o colendo STJ também se manifestou no sentido da validade da razão de discrímen em comento, senão vejamos o seguinte aresto: “E M E N T A – PREVIDENCIÁRIO – CONTRIBUIÇÃO REFERENTE A ACIDENTE DO TRABALHO – ATIVIDADE PREPONDERANTE – PESSOAL DE ESCRITÓRIO – DECRETO Nº 83.081/79. Sendo a atividade preponderante da empresa a construção civil, sujeita-se às contribuições o pessoal que trabalha no seu escritório e engenharia. Recurso provido” (REsp nº 171.526/MG – Rel. Min. GARCIA VIEIRA – 1ª Turma – j. 21.10.99 – DJ 29.11.99 – v.u.) Dessarte, as alíquotas diferenciadas não ofendem o princípio da igualdade, mas, ao contrário, constituem uma técnica de adequação da contribuição ao próprio princípio isonômico. II.5. DO AUMENTO DA ALÍQUOTA DETERMINADO PELA LEI Nº 9.732/98 Recentemente, com o advento da Lei nº 9.732, de 11 de dezembro de 1.998, que alterou o § 6º do art. 57 da Lei nº 8.213/91 e acrescentou os §§ 7º e 8º, sobre a remuneração dos empregados efetivamente sujeitos aos agentes nocivos definidos pelo Poder Executivo (art. 58 do Plano de Benefícios), passou a incidir um diferencial de alíquota de 12 (doze), 9 (nove) e 6 (seis) pontos percentuais, conforme a atividade exercida pelo segurado sujeitar à concessão de aposentadoria especial após 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos de contribuição. Vejamos, então, a atual redação do art. 57 do PBPS, in verbis: “Art.57.A aposentadoria especial será devida, uma vez cumprida a carência exigida nesta Lei, ao segurado que tiver trabalhado sujeito a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme dispuser a lei. (Redação dada pela Lei nº 9.032, de 28.4.95) § 1ºA aposentadoria especial, observado o disposto no art. 33 desta Lei, consistirá numa renda mensal equivalente a 100% (cem por cento) do salário-de-benefício. (Redação dada pela Lei nº 9.032, de 28.4.95) § 2ºA data de início do benefício será fixada da mesma forma que a da aposentadoria por idade, conforme o disposto no art. 49. § 3ºA concessão da aposentadoria especial dependerá de comprovação pelo segurado, perante o Instituto Nacional do Seguro Social-INSS, do tempo de trabalho permanente, não ocasional nem intermitente, em condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, durante o período mínimo fixado. (Redação dada pela Lei nº 9.032, de 28.4.95) §4ºO segurado deverá comprovar, além do tempo de trabalho, exposição aos agentes nocivos químicos, físicos, biológicos ou associação de agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física, pelo período equivalente ao exigido para a concessão do benefício. (Redação dada pela Lei nº 9.032, de 28.4.95) §5º O tempo de trabalho exercido sob condições especiais que sejam ou venham a ser consideradas prejudiciais à saúde ou à integridade física será somado, após a respectiva conversão ao tempo de trabalho exercido em atividade comum, segundo critérios estabelecidos pelo Ministério da Previdência e Assistência Social, para efeito de concessão de qualquer benefício. (Parágrafo acrescentado pela Lei nº 9.032, de 28.4.95). Nota: Parágrafo tacitamente revogado pelo art. 28 da Lei nº 9.711, de 20.11.98, que estabelece: “Art. 28. O Poder Executivo estabelecerá critérios para a conversão do tempo de trabalho exercido até 28 de maio de 1998, sob condições especiais que sejam prejudiciais à saúde ou à integridade física, nos termos dos arts. 57 e 58 da Lei nº 8.213, de 1991, na redação dada pelas Leis nºs 9.032, de 28 de abril de 1995, e 9.528, de 10 de dezembro de 1997, e de seu regulamento, em tempo de trabalho exercido em atividade comum, desde que o segurado tenha implementado percentual do tempo necessário para a obtenção da respectiva aposentadoria especial, conforme estabelecido em regulamento.” §6º O benefício previsto neste artigo será financiado com os recursos provenientes da contribuição de que trata o inciso II do art. 22 da Lei nº 8.212, de 24 de julho de 1991, cujas alíquotas serão acrescidas de doze, nove ou seis pontos percentuais, conforme a atividade exercida pelo segurado a serviço da empresa permita a concessão de aposentadoria especial após quinze, vinte ou vinte e cinco anos de contribuição, respectivamente. (Redação dada pela Lei nº 9.732, de 11.12.98) §7º O acréscimo de que trata o parágrafo anterior incide exclusivamente sobre a remuneração do segurado sujeito às condições especiais referidas no caput. (Parágrafo acrescentado pela Lei nº 9.732, de 11.12.98) §8º Aplica-se o disposto no art. 46 ao segurado aposentado nos termos deste artigo que continuar no exercício de atividade ou operação que o sujeite aos agentes nocivos constantes da relação referida no art. 58 desta Lei. (Parágrafo acrescentado pela Lei nº 9.732, de 11.12.98)” Assim como o complemento para financiamento do SAT, não existe vício que macule o aumento de alíquota em foco. Primeiro, porque o fundamento de validade vertical da contribuição está no próprio art. 195, inciso I da Constituição Federal, de modo que não há se falar em lei complementar; segundo, porque o aumento foi determinado por lei, assim como determina o princípio da legalidade estrita. De outro turno, insta observar que o fato do diferencial de alíquota incidir somente sobre a remuneração daqueles segurados efetivamente sujeitos aos agentes nocivos relacionados pelo Poder Executivo (§ 7º do art. 57 do PBPS) não fere qualquer princípio constitucional, ao contrário, visa emprestar à contribuição um matiz mais pessoal. Destarte, observado o princípio da anterioridade nonagesimal (art. 195, § 6º da CF), isto é, a partir de março de 1.999, a norma passou a viger em sua plenitude. III. CONCLUSÃO Fincadas estas premissas, não há como concluir de maneira diversa, senão pela absoluta pertinência da contribuição denominada vulgarmente de “SAT” com o sistema constitucional brasileiro, de modo que calha à fiveleta o supramencionado magistério de SOUTO MAIOR BORGES, segundo o qual a doutrina brasileira parece que, em matéria tributária, quer inverter a presunção de legitimidade das leis.