Habeas Corpus – sustentação oral: um direito do advogado de ser intimado para

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Luís Guilherme Vieira, advogado no Rio de Janeiro e presidente da Comissão Permanente de Defesa do Estado de Direito Democrático do Instituto dos Advogados Brasileiros. Hodiernamente, vivem os operadores do Direito que se dedicam com ardor à advocacia criminal uma das sensações que mais angustiam essa já angustiante profissão. Não raras vezes, vimo-nos na necessidade, por dever de ofício, de impetrar, em favor de constituintes, a secular ordem de habeas corpus, o qual, consoante acentua a moderna doutrina, é considerado – ou deveria ser – o instrumento processual mais imediato e célere para salvaguardar a liberdade de ir e vir do cidadão. Porém, o dia-a-dia do advogado e o congestionamento da justiça impedem, na prática, que o advogado, por mais diligente que seja, compareça a todas as sessões, na esperança de ver a sua causa apresentada pelo relator para julgamento. As audiências na primeira instância que, em sua maioria, nunca se iniciam nos horários preestabelecidos, varando comumente tarde e noite adentro, com os tribunais assoberbados por suas sessões estranguladas – pois se avolumam um sem-número de feitos a serem julgados, alguns necessitando de publicação, outros, como o writ,postos em mesa, por vezes às dezenas, em razão de sua preferência regimental de julgamento – tornam-se obstáculos ao pleno exercício do munus público conferido ao advogado (art. 133, CF), impossibilitando-o de assomar à tribuna para sustentar oralmente suas razões, como lhe faculta a lei e deseja seu cliente. Por tal razão, Antonio Carlos Barandier, incansável advogado fluminense e professor de Direito Processual Penal da Universidade Candido Mendes, houve por bem, lastreado em seus muitos anos de experiência, indicar ao vetusto Instituto dos Advogados Brasileiros uma singela proposta, com o escopo de que aquele sodalício apreciasse a possibilidade de encaminhá-la ao Congresso Nacional, a fim de que o art. 664 do Código de Ritos sofresse acréscimo de pequena expressão, a saber: ” providenciada a notificação do impetrante quando este, espontaneamente requerer, na inicial, a sustentação oral”. Ao apresentar as conclusões de seu parecer, que mereceu acolhida, o ilustre relator designado pelo IAB, dr. Jorge Luiz Dantas, endossando in totum a argumentação do professor Barandier, salientou, citando Barandier, que “A questão da não inclusão em pauta, longe de favorecer, tantíssimas vezes prejudica o paciente, eis que se suprime a sustentação oral que, em certos temas, resulta imprescindível. Os advogados, que integram a administração da Justiça e não podem ser menosprezados, em oportunidades diversas, comparecem, todos os dias de sessões, no tribunal competente, em estressante peregrinação, na expectativa da apresentação da ação de impugnação pelo Relator. Num dia de impedimento, podem ser surpreendidos com o “rápido julgamento” e, em tal hipótese, denegada a ordem, enfrentam dificuldades para prestar ao cliente satisfações pelo descumprimento do elementar dever profissional. Os advogados briosos do interior, sem condições de contratar correspondentes, geralmente são as maiores vítimas da perversa situação.” (Revista do Instituto dos Advogados Brasileiros, ano XXXIII, nº 90, 1º semestre de 1999, ed. Destaque, p. 221). A matéria sub examem, inclusive, já foi agasalhada pela Comissão de Reforma do Código de Processo Penal, instituída pela Ministério da Justiça e presidida pela talentosa professora doutora Ada Pellegrini Grinover, que, no anteprojeto apresentado, adicionou dois novos parágrafos ao artigo 664 e fez constar do primeiro a seguinte redação: Art.664…………………………………. § 1º. Se o impetrante o requerer, será intimado da data do julgamento. É importante consignar, neste momento, que a matéria aqui versada não é estranha aos nossos Tribunais Superiores, que, atentos à problemática, têm encontrado soluções extremamente justas aos feitos que lhes são dados a apreciar. Por exemplo, a Sexta Turma do egrégio Superior Tribunal de Justiça, seguindo o voto condutor do ministro Luiz Vicente Cernicchiaro, ao julgar, em 24.3.98, o recurso ordinário constitucional de nº 7.198-7/SP, deu-lhe provimento, por entender que: “HABEAS-CORPUS. INTIMAÇÃO DO IMPETRANTE DA DATA DO JULGAMENTO. “O habeas-corpus prescinde de inclusão do processo em pauta. Todavia, se longo o transcurso do tempo entre a conclusão dos autos e o julgamento, necessária intimação ao impetrante. Não é de exigir-se do advogado comparecer ao tribunal todos os dias de sessão”.” (In Boletim IBCCRIM nº 67, junho de 1998, p. 262). Da mesma forma, conforme registra Antonio Carlos Barandier, “o excelente ministro Marco Aurélio, sensível à realidade, adotou a prática de notificar os impetrantes do julgamento. Aí está medida salutar que a lei processual deve impor e os regimentos consagrarem até mesmo em homenagem aos advogados e aos relevantes interesses dos pacientes” (Antonio Carlos Barandier, “Habeas corpus: uma questão relevante”, Boletim IBCCrim nº 76, março de 1999). Ademais, também já existem, no Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, diversas manifestações, consolidadas através de decisões monocráticas e do colegiado, conferindo ao advogado impetrante de habeas corpus o direito à notificação prévia. O leading case e, portanto, o principal decisum, originou-se quando do julgamento do habeas corpus 3.199/99, da 5ª Câmara Criminal, relator o eminente desembargador Sergio Verani, que, acolhendo pedido contido na impetração, determinou a remessa de idêntica proposta à análise do Órgão Especial, responsável pelas modificações do Regimento Interno da corte estadual. De igual forma manifestou-se o ilustre desembargador Raul Celso Lins e Silva, por meio de despacho publicado no D.O. de 17.10.00 e endereçado ao diretor da secretaria da 17a Câmara Civil do Tribunal de Justiça fluminense, no qual fez consignar sua irrestrita adesão à tese aqui esposada. In verbis: “Com o propósito de proporcionar ao advogado o exercício de seu munus, comparecer à sessão de julgamento e assomar à tribuna para sustentar, oralmente, as suas razões, recomendo a V. Sa. que nos pedidos de “habeas corpus”, nos quais figure o signatário como Relator, logo após aposto o despacho “em mesa” sejam os mesmos incluídos em pauta de julgamento a ser publicada na imprensa oficial, sempre que o impetrante, espontaneamente, requerer, na inicial, a sua notificação para sustentar, oralmente, a mandamental.” No mesmo sentido, encontraremos, ainda, manifestações similares dos insignes desembargadores fluminenses Maria Helena Salcedo (HC 2178/00, D.O. de 30.8.00 e HC 2404/00, D.O. de 15.9.00), Cláudio Tavares (HC 2177/00, D.O. de 17.8.00 e HC 260/01, D.O. de 22.3.01) e Moacir Pessoa de Araújo (HC 2513/00, D.O. de 22.11.00), os quais, deferindo pleito dos impetrantes dos remédios heróicos, determinaram a inclusão dos mandamus em pauta, notificando-se, por conseguinte, os advogados. Posta esta importantíssima questão em debate e sendo ela, inquestionavelmente, uma prerrogativa inalienável dos operadores de Direito – que desejosos de assomar às tribunas para sustentar, oralmente, as razões sacudidas nos mandamus por eles impetrados –, não podem as cortes de justiça, sob a alegação de inexistência de previsão legal, aliada à pretextada celeridade processual (um habeas corpus, em média, nunca é julgado em menos de trinta a quarenta e cinco dias, sabemos todos nós), deixar de incluir, em pauta, o feito, possibilitando ao operador de Direito se cientificar, de maneira idônea, da data do julgamento dos writs, desde que requerido, sob pena de se ter um julgamento nulo, por cerceamento de defesa, ex-vi de nossa Carta Política. Ao fim e ao cabo, verificamos que compete, por excelência, aos advogados brasileiros, principais artífices da evolução doutrinária e jurisprudencial pátrias, a sacrossanta missão de, a cada impetração de ordem de habeas corpus requerer aos tribunais seja o remédio heróico posto em pauta, possibilitando, dessa forma, ao operador do Direito ser regularmente intimado para a sessão de julgamento do feito, para que assim possa, querendo, assomar a tribuna e sustentar, em favor de seu constituinte, as razões expostas no writ, tudo em homenagem ao chamado devido processo constitucional.