O recurso de agravo sofre mudanças, para vencer a morosidade da Justiça. Conse
A primeira alteração processual adotada com objetivo de dar maior celeridade aos processos judiciais de natureza cível, após a promulgação da Emenda Constitucional 45/2004, denominada de “Reforma do Judiciário”, veio com a Lei nº 11.187/05, sancionada pelo Presidente da República em 19.10.2005, e que entrará em vigor em 19 de janeiro de 2006. Pelo nova lei, foram alterados os artigos 522, 523 e 527, da Lei nº 5.869/73 – Código de Processo Civil vigente. As mudanças deram ênfase especial ao recurso de agravo na forma retida, que terá predominância nas hipóteses de cabimento do recurso, ficando o agravo de instrumento restrito aos casos que comprovadamente vier sofrer a parte sucumbente “lesão grave e de difícil reparação”, bem como nos casos de inadmissão do recurso de apelação e nos relativos aos efeitos atribuídos ao mesmo recurso de apelação, quando de seu acolhimento. Como justificativa para as mudanças ora introduzidas, repete-se que a utilização constante e em grande número do agravo de instrumento pelos advogados acabou abarrotando os Tribunais com milhares de recursos que diariamente são interpostos, sendo essa uma das preocupações das autoridades do Poder Judiciário, uma vez que a morosidade da justiça passou a ser um questionamento constante da sociedade. Ao que parece, foi para tentar estancar essa enxurrada de agravos de instrumento é que chegou a Lei 11.187/05, pois estreitou consideravelmente o leque de situações para o cabimento dessa modalidade do recurso, cujas hipóteses e reflexos no cotidiano dos operadores do direito serão a seguir analisados. 2. Principais alterações introduzidas pela nova lei Pela legislação vigente, o recurso de agravo cabe das decisões interlocutórias, estas definidas no artigo 162, § 2º do Código de Processo Civil, e que são proferidas na 1ª e 2ª Instâncias, cujo recurso pode ser nas modalidades de agravo retido ou agravo de instrumento. O Agravo Retido, interposto na própria Instância recorrida, tem efeito prático restrito, uma vez que não produz efeitos imediatos, e tem seu exame apenas depois do julgamento do feito, ou seja, proferida a Sentença, julgando ou não o mérito da causa (art. 162, § 1º, CPC), e somente na hipótese de ser interposto recurso de apelação pelo sucumbente, quando o recurso deve ser suscitado em matéria preliminar às razões da apelação. Pela legislação vigente, ora modificada pela Lei 11.187/2005, em algumas situações previstas no CPC, a forma retida já é obrigatória, conforme a previsão do § 4º, do artigo 523, tais como das decisões proferidas na audiência de instrução e julgamento e das posteriores à sentença, salvo nos casos de dano de difícil e de incerta reparação, nos de inadmissão da apelação e nos relativos aos efeitos em que a apelação é recebida. Na maioria das vezes em que a decisão interlocutória traz prejuízo às partes, os interessados se valem do agravo de instrumento, interposto perante o Juízo “ad quem”, com o deliberado objetivo de reverter, de imediato, os efeitos da decisão atacada. Quando o recurso não é acolhido pelo Juiz relator, e este converte o agravo de instrumento em agravo retido (art. 527, II, CPC), determinando sua remessa à primeira instância, possibilita ao agravante o manuseio do agravo regimental, ensejando o reexame da urgência ao órgão recursal competente. Pelas mudanças introduzidas pela Lei 11.187/05, preponderará a partir de 19.01.2006 o recurso de agravo retido, o que, se de um lado, provocará o desejado desafogo dos Tribunais, de outro, por certo, trará prejuízo significativo, ao nosso ver, aos jurisdicionados, que não terão a oportunidade para reverter de imediato as decisões interlocutórias que lhes forem desfavoráveis. Observe-se, por oportuno, que o agravo de instrumento, em princípio, é recebido apenas no efeito devolutivo, não postergando sua interposição o andamento do processo no juízo “a quo”. Portanto, parece-nos inconsistente o argumento de que o recurso é responsável pelo retardamento da solução dos processos. Dentre as alterações trazidas na Lei 11.187/05, destacam-se as seguintes: ___Cabimento do recurso de Agravo de Instrumento, a ser interposto perante o Juízo “ad quem”: -quando a decisão interlocutória agravada, ameaçar ao recorrente de “lesão grave e de difícil reparação”; -nos casos de não ser recebida a apelação; -quanto aos efeitos em que o recurso de apelação é recebido. Assim, se o juiz na 1ª Instância, ao receber uma apelação, lhe atribuir somente efeito devolutivo, e o recorrente almejar o duplo efeito (também o suspensivo), terá cabimento o agravo de instrumento. A situação inversa – apelação recebida no duplo efeito, e o agravante se insurgir contra a decisão, entendendo não ser cabível o efeito suspensivo – também ensejará o agravo de instrumento. Observe-se que pela nova disposição legal, caberá ao juiz relator, ao receber o recurso, em decisão monocrática e irrecorrível, decidir e mensurar sobre a existência de “lesão grave e de difícil reparação”. __Cabimento do recurso de Agravo Retido, que será interposto perante o Juízo onde tramita a ação: -Como regra, caberá de todas as decisões interlocutórias proferidas no decorrer de uma ação, excetuando-se as que possam provar lesão grave e de difícil reparação. Assim, o agravo retido será – recurso próprio a ser utilizado pelos recorrentes; -Caberá nas decisões proferidas em audiência, quer as de conciliação, quer as de instrução e julgamento; -Quando o recurso de agravo retido couber em audiência, deverá ser interposto oralmente, ou seja, no ato e será lançado no respectivo termo. 3. Visão crítica das mudanças introduzidas Pela nova lei, o que antes era facultativo aos jurisdicionados, ou seja, a escolha da modalidade do agravo, dependendo da urgência e de seu interesse, agora passa a ser obrigação às partes. Pela lei vigente, o recorrente pode interpor o recurso oralmente (art. 523, § 3º, CPC), ou no prazo de 10 (dez) dias, assinalado na legislação processual. Essa nova disposição – do agravo na forma oral – certamente causará muita polêmica, pois criará situações de conflito, inclusive quanto ao tratamento das partes, diante de um mesmo processo. Ao nosso ver, o legislador, de forma afoita e equivocada, acabou criando um novo prazo recursal: o prazo “à vista”, no próprio ato, quando a parte prejudicada, terá poucos minutos, até o encerramento do termo de audiência, para manifestar seu inconformismo. A nova previsão legal parece-nos absurda, e se coloca em desalinho com os princípios processuais e constitucionais, que garantem igual tratamento às partes litigantes. Tomemos algumas situações passíveis de agravo, para melhor entender o conflito que, por certo, advirá dessa nova imposição legal. De um lado, teremos o autor requerendo o pronto provimento jurisdicional com pedido liminar de antecipação da tutela. Na hipótese do juiz indeferir o pedido, possibilitará ao autor o manuseio do recurso de agravo de instrumento, alegando urgência no provimento e risco de lesão grave e de difícil reparação. Terá, para tanto, o prazo de 10 (dez) dias para interpor o recurso de agravo de instrumento. De outro lado, o requerido que venha argüir a contradita de uma testemunha não acolhida pelo juiz, ou ainda que venha impugnar a juntada de um novo documento em audiência, documento este que já existia quando do ajuizamento da ação, e esta impugnação for indeferida, terá que promover o recurso de agravo retido, no ato, ou seja, “à vista”. Teremos, nessas hipóteses, assegurado ao autor o direito do agravo de instrumento em dez dias; e ao requerido, o agravo retido, no ato, na própria audiência, o que por certo estará em total falta de sintonia com o tratamento isonômico que o magistrado deve dispensar às partes. Por fim, outra alteração que trará prejuízos aos agravantes é a que prescreve que a decisão do juiz relator que converter o agravo de instrumento em agravo retido será irrecorrível. Esta é mais uma previsão que acaba dando poder ilimitado ao juiz relator do recurso, reconhecendo suas decisões como intocáveis, e que certamente afronta, na sua essência, princípios inerentes ao regime democrático. Melhor andaria o legislador se tivesse mandado aplicar para essa hipótese a norma contida no artigo 557, § 1º, do Código de Processo Civil, autorizando o manuseio do chamado agravo regimental, possibilitando ao órgão julgador reapreciar a decisão monocrática do relator. Não temos nenhuma dúvida que os Tribunais vão ficar desafogados, com o novo procedimento a ser adotado. Pena, no entanto, é que esse desafogo venha em evidente prejuízo aos jurisdicionados. 4. O “Novo Agravo” e a morosidade da Justiça Há muitos anos, discute-se a respeito das causas que determinam o mau funcionamento da Justiça no Brasil, com repercussão na morosidade das decisões judiciais e no descrédito da própria Instituição. Lembramos que, nos idos de 1980 a 1985, no Estado de São Paulo, onde temos experiência profissional e pessoal, o tempo médio para o julgamento de um recurso de apelação, era de 9 a 12 meses. No início de 1990 e nos anos subseqüentes, esse tempo médio passou para 24 meses. Em 1995, passamos a esperar entre 30 a 36 meses para o julgamento do mesmo recurso. E agora, mais recentemente, a partir de 2003, a demora para o julgamento do recurso de apelação pode chegar a 48 meses. Isso mesmo, 48 meses!!! Então, é de se perguntar: o que o recurso de agravo de instrumento tem a ver com isso? Temos conhecimento, pelo contato e depoimentos de funcionários do Poder Judiciário, notadamente dos Fóruns do interior do Estado, onde temos muitos alunos ou ex-alunos, que a estrutura e condições de trabalho em alguns Cartórios é simplesmente caótica. Os computadores ainda são aqueles modelos desprezados pelos Bancos e grandes empresas, nos idos de 1993, 1994, 1995 e anos subseqüentes, doados ao Poder Judiciário, em atos de duvidosa generosidade, e cujos modelos ainda estão em pleno uso, por falta de outros mais atualizados. Ainda são encontrados em algumas dependências do Judiciário, os então famosos XT, ou PC “286”, “386”, 486, 586, etc., que têm como redator ainda os programas Carta Certa 3, 5 ou 8 – lembram deles? Para não falar na falta de papel, fita para as impressoras matriciais, dentre outras necessidades básicas para o atendimento dos jurisdicionados. Certamente, enquanto perdurar esse quadro de total abandono na estrutura dos Cartórios e Ofícios do Poder Judiciário, não será com uma “Reforma do Judiciário”, apenas no papel, e com mudanças na legislação, que venham ferir de morte princípios processuais e constitucionais antes assegurados aos jurisdicionados, que vamos acabar com a morosidade da Justiça. 5. Conclusão Pela breve análise ora feita, sobre os efeitos que advirão da Lei 11.187/05, a partir de sua vigência, em 19 de janeiro de 2006, acreditamos que a morosidade da Justiça em nada será afetada, pois, na prática, teremos novos embates, com a procura pelos advogados, no dia a dia das lides processuais, de saídas para suprir a limitação do uso do recurso de agravo de instrumento. De concreto mesmo, entendemos que a nova sistemática acabará simplesmente ressuscitando o Mandado de Segurança, como remédio heróico a ser utilizado pelos advogados, depois de restar esgotada a via recursal do agravo de instrumento, como meio idôneo para barrar injustiças e restabelecer o equilíbrio nas relações processuais entre os jurisdicionados.