Próximo presidente do TST é a favor da demissão de juízes

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O ministro Vantuil Abdala, que assumirá a Presidência do Tribunal Superior do Trabalho no dia 14 de abril, defende a demissão de juízes que cometem irregularidades e uma sanção maior para as partes que recorrem indevidamente. Para ele, o maior problema do Judiciário — a morosidade — pode ser resolvido desde que haja “vontade política”. Segundo o ministro, a relação dele com o governo federal é de “harmonia e respeito”. Abdala também defende a alta de juros na Justiça, porque os índices atuais (1% na Justiça do Trabalho e 2% nas Justiças Comum e Federal) são um desestímulo ao acerto de contas. “Em todos os ramos do Judiciário é importante que haja uma sanção maior para aquele que descumpre a lei.” Em sua gestão, o futuro presidente do TST pretende estabelecer mais súmulas, estimulando os Tribunais Regionais do Trabalho a uniformizar suas jurisprudências. O ministro destacou como positiva a proposta de criação da Escola Nacional da Magistratura, que consta do projeto de reforma do Judiciário. “Não há lei boa sem bons aplicadores”, explica. “É um despropósito que um garoto recém-saído da faculdade — sem nenhuma experiência de vida, sem nenhum amadurecimento, simplesmente por ter sido aprovado num concurso puramente teórico — assuma, de imediato o exercício da magistratura e passe a decidir a vida das pessoas e o seu patrimônio.” Leia a entrevista: O senhor acredita que há solução para os problemas do Judiciário brasileiro? Hoje o maior problema do Judiciário brasileiro é a delonga na prestação jurisdicional. Têm surgido outras questões, principalmente nos últimos tempos, que dizem respeito a algum deslize no exercício da magistratura ou, como a imprensa tem chamado, de corrupção na magistratura. Felizmente, são casos isolados e estão sendo tomadas iniciativas para coibir ações dessa natureza e punir os atos impróprios ou indevidos. A magistratura é, naturalmente, muito fiscalizada — não só na parte administrativa pelo Tribunal de Contas da União, como na própria prestação jurisdicional, pois em toda ação há advogados dos dois lados. É possível que haja deslizes, mas é muito difícil que haja um ato impróprio que não se torne de conhecimento público, até porque as sessões de julgamento são públicas. A Justiça está de portas abertas para receber qualquer denúncia. O que tem acontecido ultimamente é uma comprovação de que os casos isolados estão sendo levantados e devidamente punidos. A Justiça tem aplicado a pena máxima para os casos de deslizes mais graves, ou seja, a pena de aposentadoria compulsória proporcional ao tempo de serviço. Pode-se achar que essa pena é branda, mas é a pena que consta da lei. O juiz não tem como deixar de aplicá-la. Então que se mude a lei. Acho mesmo que deve haver a pena de demissão administrativa — a despedida pura e simples. Inclusive isso consta da proposta que fizemos para a alteração da Lei Orgânica da Magistratura. Na sua opinião, quais são os principais problemas do Judiciário e como resolvê-los? Acredito que o maior problema é a morosidade. Há solução para ela, basta que haja vontade política em relação a isso. Para tanto, é fundamental a mudança nos códigos de processo. O número de recursos existente na legislação brasileira é algo que impressiona qualquer estrangeiro que tome conhecimento do nosso sistema. É possível que haja oito, dez, doze ou mais recursos na fase normal da ação, e outros tantos, em mesmo número, na fase de execução. É possível que na fase normal da ação o processo passe pelo primeiro grau; pelos tribunais, em segundo grau; pelos tribunais superiores, em terceiro grau e vá até ao Supremo Tribunal Federal. Ainda que o recurso seja impróprio ou indevido, a parte poderá apresentá-lo, e, até o tribunal dizer que não conhece do recurso por não ser cabível, levará um tempo considerável sem uma conseqüência maior para a parte. É necessário não só diminuir o número de recursos, como também estabelecer uma sanção maior para a parte que recorre indevidamente. Temos reiterado, por exemplo, que os juros, de um modo geral, são pequenos, especialmente na Justiça do Trabalho — de 1% em virtude de uma lei específica —, enquanto na Justiça comum e na Justiça Federal são de 2%. Este fator faz com que haja um desestímulo para o empregador solver com brevidade o débito na Justiça do Trabalho. Mas não é só na Justiça do Trabalho. Em todos os ramos do Judiciário é importante que haja uma sanção maior para aquele que descumpre a lei, além da necessidade de se reduzir o número de recursos. O senhor é a favor de uma reforma radical do Judiciário? Na sua opinião, como deveria ser feita essa reforma? Não vejo de que maneira poderia ser feita uma reforma radical no Judiciário. Acho que há propostas muito importantes no âmago da emenda de reforma do Judiciário, como a que cria a Escola Nacional da Magistratura para cuidar da seleção e preparação do futuro magistrado como também do aperfeiçoamento dos atuais magistrados. Não há lei boa sem bons aplicadores. Isso é fundamental. Não temos um sistema de seleção adequado como o que se verifica na Escola de Magistratura francesa, que é um modelo para o mundo todo. Lá, após passar por um rigoroso exame de seleção, o candidato não se torna um juiz de imediato. Ele passa por um período de estágio, adaptação e aprendizado para, em primeiro lugar, conhecer a realidade sócio-econômica do país, as estruturas dos órgãos administrativos, as várias entidades que compõem a sociedade. Só depois disso, ele se aprofunda nas questões do campo jurídico como as questões de processo, de procedimento. É um despropósito que um garoto recém-saído da faculdade — sem nenhuma experiência de vida, sem nenhum amadurecimento, simplesmente por ter sido aprovado num concurso puramente teórico — assuma, de imediato o exercício da magistratura e passe a decidir a vida das pessoas e o seu patrimônio. O governo Lula pretende criar um órgão de controle externo do Judiciário. O senhor é a favor da instituição de um órgão desse gênero? Qual deveria ser a composição desse conselho? Fala-se muito hoje em um órgão do controle externo do Judiciário. No Brasil, o Judiciário é um Poder, e, sendo assim, não se pode falar em controle. Se isso ocorrer, o Judiciário deixará de ser um Poder. É muito importante para a democracia que o Poder Judiciário seja independente. O que deve haver é tal como está na proposta da emenda da reforma do Judiciário: a criação do Conselho Nacional de Justiça, que seria composto por ministros dos tribunais superiores, dos tribunais regionais e estaduais e até de juízes de primeiro grau, além de representantes da Ordem dos Advogados do Brasil e Ministério Público. Depois de apresentados pelos respectivos órgãos de origem, haveria a indicação pelo presidente da República e a aprovação pelo Senado Federal. Acredito que a participação de todos representantes fará do Conselho Nacional de Justiça um órgão mais do que suficiente para acompanhar as atividades do Judiciário. Defendo que o conselho seja composto por segmentos ligados à magistratura. Acho que a presença de políticos trará o risco de uma interferência indevida no Poder Judiciário. Nunca tivemos um órgão dessa natureza e não vejo razão nenhuma para não experimentarmos. Quais mudanças o senhor planeja na sua gestão à frente do TST? Na Justiça do Trabalho temos sempre em mente a luta constante para dar celeridade à prestação jurisdicional. Considero muito importante estabelecer súmulas para orientar os jurisdicionados sobre a nossa jurisprudência. Por isso, pretendo estimular os Tribunais Regionais do Trabalho a uniformizar suas jurisprudências porque há muitas matérias que dizem respeito a uma região específica, e, muitas vezes, sequer chegam ao Tribunal Superior do Trabalho. É inconcebível que turmas de um mesmo TRT decidam de maneira diferente uma mesma matéria. Não há nada que comprometa mais a imagem da Justiça do que uma pessoa ter ganho de causa em uma ação, e a outra, com ação idêntica, nas mesmas circunstâncias e condições, perdê-la. O cidadão que perdeu a ação nunca conseguirá entender o que aconteceu. Por isso é muito importante que os Tribunais Regionais do Trabalho uniformizem suas jurisprudências. Com isso, estarão simplesmente cumprindo o que determina a lei. A celeridade na prestação jurisdicional e a uniformização da jurisprudência são as metas principais do Tribunal Superior do Trabalho. Além disso, o Tribunal Superior do Trabalho não tem se limitado apenas à sua atividade de julgar os conflitos. Temos participado efetivamente na própria formulação do Direito do Trabalho no País e de uma legislação social que evite a ação e permita o desenvolvimento da nação com uma aproximação entre os interesses da classe trabalhadora e da classe do capital. Além disso, o TST tem tido uma atitude em relação a problemas da área trabalhista, principalmente no que diz respeito ao trabalho infantil e ao trabalho exercido em condições análogas ao de escravo. Essas questões dizem respeito ao trabalho e, portanto, dizem respeito ao Tribunal Superior do Trabalho. Temos tido uma preocupação constante de combater abusos nesta área e de evitar que esta chaga, que tanto macula a imagem do Brasil no exterior, permaneça entre nós. Como é a sua relação com o governo Lula? A nossa relação com o governo federal é de harmonia e respeito. Aliás, como sempre foi e deve ser. Embora os Poderes sejam independentes, devem ser harmônicos entre si. O Poder Judiciário do Trabalho, que é uma Justiça social, esteve sempre atento às questões de interesse da sociedade, que, muitas vezes, são os próprios interesses do governo. Nesse sentido, a Justiça do Trabalho sempre teve e continuará a ter as melhores relações com o governo central.