1ª advogada de Ivinhema Maria Alice Leal Fattori superou falta de energia e estrada de terra por amor à profissão

55 km separava da Comarca Nova Andradina e 1 mil km da Capital da época Cuiabá
Sul-mato-grossense de coração, a Advogada Maria Alice Leal Fattori se mudou em 1976 para Ivinhema. Recém-formada na Capital de São Paulo, ele decidiu se aventurar no interior do então Mato Grosso uno. Sua atuação também foi marcada pelo pioneirismo: primeira advogada da cidade.
Ela trocou as avenidas da capital paulista, o fácil acesso aos meios de comunicação, o cinema e o teatro pela cidade recém-criada Ivinhema, distante 55 km da Comarca de Nova Andradina e cerca de 1 mil km da então Capital do Estado Cuiabá.
À época, deixou o conforto de lado para enfrentar, com coragem, a missão de ser a primeira advogada da cidade. A missão? Fazer parte do quadro jurídico de uma empresa de loteamento de imóveis. “Em visita à cidade, onde residia meu saudoso irmão, recebi o convite do Diretor da Empresa, colonizadora do munícipio de Ivinhema, pois não tinham advogados em Ivinhema. Embora, recém-saída dos bancos da faculdade não tive medo, sabia que tinha coragem e condições de advogar. Sempre encarei as diversidades”.
Os obstáculos não foram poucos, mas a vontade de trabalhar e a paixão pela advocacia fizeram encarar o desafio em terras mato-grossenses. “Não tinha energia, asfalto e o único meio de comunicação era o correio. A Comarca na época era Nova Andradina, para ajuizar uma ação tinha que percorrer 55 km de estrada de terra, ora de lama ora de poeira. O primeiro Juiz que trabalhei foi o Desembargador Dr. Jose Augusto de Souza, com quem aprendi muito. Foi enfrentando todas as diversidades que inicie meu mister de advogada, aqui aprendi a advogar. O início foi difícil, pois era a única advogada da cidade, não tinha outro colega para dividir minhas dúvidas, tinha que achar nos livros. Mais cada ano que passava aprendia mais e apaixonava pelo direito”.
Esses empecilhos não fizeram Doutora Maria Alice desistir da carreira na área civil e trabalhista. “Foi muito desafiador, mas não era um nenhum desconforto, pois sabia das diversidades que os jovens advogados deveriam enfrentar. Hoje temos o privilégio de contar com um computador, internet, pesquisas no Google, enquanto naquela época para ajuizar uma ação primeiro se rascunhava a petição, separava as jurisprudências e datilografava em papel sulfite, um detalhe sem erros e rasuras”, lembra ela.
No fim da década de 70, ela consegue a inscrição suplementar na OAB-MT, onde recebe o nº 1.778-A. Após a divisão do Estado em 1979 é transferida para Mato Grosso do Sul, com mesmo número.
Nascida em 28/10/1945 em Lutécia, ela se formou na cidade vizinha, na segunda turma de Direito da Faculdade de Direito da Alta Paulista de Tupã (FADAP). “Passei pelo Exame da OAB, naquela época foi escrito e oral, realizado na própria faculdade com a presença da OAB/SP. Recebi a tão desejada e sonhada carteira da OAB-SP, com o nº. 39.148-SP”.
Antes de seguir a advocacia, ela trabalhou em uma indústria de essências em Assis/SP, entrando como escriturária chegando ao posto de gerente. Cogitou fazer Administração, mas a “profissão dos meus sonhos” foi maior.
A cidade de Ivinhema era pequena e a carteira de clientes baseada no respeito e honestidade. “Construí uma carreira trabalhando honestamente. Pois, o grande desafio do advogado em abraçar a advocacia é sua capacidade de contribuir com a solução dos problemas dos clientes. Sempre ouvindo os clientes e aconselhando para, em conjunto, achar a melhora caminho. Nunca se esquivando do cliente”, pontua.
Doutora Maria Alice Leal Fattori já foi Vice-Presidente da OAB Nova Andradina, quando Ivinhema pertencia à Subseção. Posteriormente, Vice-Presidente e Presidente da Subseção Ivinhema, na gestão 2001-2003, além de Delegada da CAAMS de Ivinhema na gestão 2013-2015.
Casos emblemáticos
A empresa na qual Doutora Fattori trabalhava entrou com processos de reintegração de posse em face de casos de ocupação de terra. Em dois emblemáticos, acionistas tiveram suas fazendas no município de Diamante do Norte, Estado do Paraná, ocupadas pelo Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST).
Em um dos casos, ela conta: “Quando da desocupação, os policiais chegaram por volta das 6 horas da manhã e graças à Deus havia chovido, pois o movimento havia feito minas de pólvora na entrada da fazenda que só não explodiram porque a chuva molhou os garrafões e a pólvora”.
Como o líder dos sem terras havia assinado o mandado de desocupação na primeira invasão tínhamos o nome e qualificação do mesmo e registramos o B.O, e teve que responder uma ação penal, ficando preso por mais ou menos um ano, foi assim desarticulado o grupo.
Na outra, segundo a decana, os funcionários da fazenda foram feitos reféns e as casas destruídas. “Essa última foi uma das mais desgastantes, pois a desocupação foi realizada com um aparato de 300 policiais e depois de 20 dias, os sem-terra em um número de 40 homens, todos encapuzados por volta das 4 horas da manhã, destruíram as casas dos funcionários e os fizeram reféns, soltando-os duas horas depois com a chegada da polícia”.
Recado aos mais jovens
Os obstáculos hoje em dia são outras, mas a coragem do profissional da advocacia, para a Doutora Maria Alice é a mesma. “Os jovens advogados primeiro devem ter a coragem de enfrentar as diversidades da profissão, estudar muito, respeitar seus clientes para ser respeitado, ser honesto, não se esquivar diante das diversidades, pois o advogado não pode ser insensível com os dramas que lhe são trazidos pelos clientes. Ter como lema um atendimento por excelência, não só dentro de escritório mais fora também, isso lhes fará alcançar uma boa imagem profissional”.
Aos 75 anos, a ex-Presidente da Subseção Ivinhema complementa que foi desse modo que construiu uma carreira e clientes. “Sempre fui consciente que a coragem de enfrentar as diversidades não era uma ousadia, mas o destemor de enfrentar as mais difíceis tarefas que me foi confiada pelos meus clientes. Portanto, sempre tive a consciência que o ouvir para aconselhar e achar o melhor caminho e não deixar levar pela emoção”.
E o recado também vai para o biólogo e estudante de Direito Fábio Cesar Leal Fattori, filho de Maria Alice com o esposo Cesar Aparecido Fattori.
A Advogada e ex-Presidente da Subseção Ivinhema Maria Alice Leal Fattori foi uma das decanas entrevistadas pela equipe de imprensa da OAB/MS. Já contaram suas histórias Marline Kalache, Salim Moises Sayar, Dinalva Garcia,Rosely Coelho Scandola, Ana Abdo, Alci Araújo, João Glauco Arrais, Aparecidos dos Passos, Belmira Vilhanueva, Osvaldo Feitosa de Lima,Vicente Sarubbi, Jorge Gai , Natalina Luiz de Lima, Ademar Mariani, Milton Melgaref da Costa, Silvia Bontempo, Eduardo Coelho Leal, Juracy Alves Santana, MárioPeron, Felix Balaniuc, Margarida Aidar, Margarida Cavalheiro, Levi Moroz, Adelice Rezende Guimaraes e Vilton Divino Amaral.
Texto: Catarine Sturza / Foto: Arquivo Pessoal